Sérgio Conceição foi convidado para uma entrevista com um tom mais pessoal do que profissional e contou episódios curiosos da carreira, falando também de algumas características da personalidade.
O treinador português realçou a forma como consegue gerir um balneário, assegurando que não é fácil estar à espera da adaptação de cada jogador porque os resultados têm de aparecer.
“Não é com marés de água doce que se conseguem grandes conquistas, tem de ser na turbulência, naquilo que são essas marés e as vagas de muitos metros para que os marinheiros tenham sucesso. Para que aprendam, no meio dessa dificuldade e dessa exigência diária, a navegar de forma fantástica. Dentro de uma equipa de futebol chega-nos um jogador da América do Sul, que não está habituado a determinada exigência e com um futebol diferente. Não é fácil chegar e ter resultados no imediato. Mas nós temos de os ter, porque as pessoas vivem de resultados”, afirmou.
O ex-dragão revelou que considera que não existem impossíveis e que irá sempre tentar superar todos os obstáculos.
"Só é impossível até o momento em que se consegue fazer. Se tenho uma parede, é preciso passar essa parede. À cabeçada será mais difícil, como é que eu vou fazer? Mas enquanto não conseguir, vai ser difícil atirar a toalha ao chão. Para chegar à equipa senior do FC Porto, não podia falhar. Se tivéssemos um teste de ió-ió, por exemplo... Tinha que ganhar. Vomitando no final, estando mal um dia ou dois, mas tinha que ganhar", contou.
Conceição reconhece o forte sentido de competição e os esforços que faz para que a vitória seja uma constante, recordando o momento em que se apercebeu de que não estava convocado para representar a seleção nacional nos Jogos Olímpicos de 1996, em Atlanta.
“Eu desde miúdo tive uma grande vontade de ganhar, uma grande vontade de vencer na vida. Estava no Felgueiras, não fui convocado para os Jogos Olímpicos e fiquei dois dias na cama, não quis ver ninguém, sem comer sem nada. Vivia muito a minha profissão, tinha muita vontade de conquistar e de honrar o sacrifício da minha família para que jogasse."
Ainda sobre a competitividade que marcou muitos dos episódios mais polémicos do português, quer enquanto jogador ou treinador, contou um episódio que envolve o antigo selecionador nacional, Fernando Santos.
“Nos primeiros dois jogos do Europeu'2020 fiquei no banco, uma azia que não podes imaginar. O Fernando Santos, ex-selecionador nacional, apanhou-me como jogador em final de carreira no PAOK e diz que fui - perdoem-me o termo - o jogador mais ranhoso que apanhou. De todos. Eu como treinador não gostava de ter um jogador Sérgio. Gostava de ter algumas das caraterísticas do jogador Sérgio, mas não aquela azia descomunal, ser insuportável quando perdia. Se ficasse no banco era um problema comigo. Mas não com os colegas ou treinadores, mas comigo”, confidenciou Conceição.
Na vida pessoal, Sérgio afirma que era preciso gerir esse lado menos positivo e admite que era difícil lidar com as derrotas, revelando a importância da sua esposa nesses momentos.
“Desde miúdo que tenho uma grande vontade de vencer na vida, a minha mulher é completamente diferente de mim porque é muito tranquila de caráter. Soube ser esse equilíbrio. Quando eu perdia um jogo, durante dois dias era impossível falar comigo. Hoje temos um casamento muito sólido, mas não foi nada fácil lidar comigo."
Em jeito nostálgico, o antigo técnico do FC Porto relembrou o hat-trick que fez diante da Alemanha no Euro 2000, que contribuiu para a vitória de Portugal por 3-0.
"Nesse jogo com a Alemanha, teve que ver com esse momento. Tinha feito épocas fantásticas e era sempre o 12.º jogador. Os violinos da Seleção, Rui Costa, João Vieira Pinto, mais tarde o Pauleta, o Figo. Enfim, da frente quem saía? Eu não podia com aquilo e não suportava. O Humberto Coelho [selecionador no Euro'2000], com uma Alemanha fortíssima… Foi uma oportunidade única. Quando o Humberto deu a equipa eu fui para o quarto e estava com outro jogador e juntaram-se quatro ou cinco. O pessoal a pensar que o Sérgio estava feliz. 'Vai jogar a titular e não vai lixar a cabeça a ninguém'. Eu com uma azia. 'Este homem quer-nos lixar'. Eu disse: 'Como e que possível mudar a equipa toda? Jogar com três centrais, nunca jogámos assim, quer dar moral aos titulares'. Fizemos um jogo maravilhoso. Tínhamos jogadores muito inteligentes a jogar nas melhores da Europa. Eram tempos diferentes. Hoje tudo se prepara", expressou.
Sobre o futuro, Sérgio Conceição não adianta pormenores, mas garante que não pensa em terminar a carreira num futuro próximo, apesar de que há quatro meses a resposta poderia ser outra.
"Ainda não tracei uma meta, sou assim enquanto treinador e já era assim enquanto jogador. Vivo muito aquilo que é o dia a dia, tudo de uma forma muito intensa. Não penso nisso. Se me perguntasses isso há quatro meses, ali na fase final da minha 7.ª época no FC Porto, dir-te-ia que brevemente. Estava num momento... Agora, depois de dois meses em casa, já não penso e a minha mulher agradece."
É de recordar que o português está sem clube desde o final da temporada passada, período em que deixou o comando técnico dos dragões. Até ao momento, têm sido vários os clubes apontados ao futuro do treinador, ainda que nenhum deles se tenha revelado efetivamente como uma opção para Conceição.
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