Dor, sofrimento, fome, exploração, pobreza e morte. Este não seria o sonho de quem partiu de terras longínquas em busca de melhores condições de vida. O Mundial de 2022, antes de acontecer, já está manchado em sangue migrante. É nesse contexto que Cristiano Ronaldo, Messi, Neymar e companhia vão tentar entreter milhões de amantes do futebol durante um mês, num país a quem nunca devia ter sido atribuído a organização de um evento desportivo. Não só pelos mais de 6500 trabalhadores que morreram, enquanto erguiam os mais modernos estádios do Mundo, e as melhores infraestruturas para a prova. Mas também pela comunidade LGBTI+, onde a homossexualidade é crime. Isto em pleno 2022.

A poucos dias do início do Mundial de futebol no Qatar, há um lado que se quer abafar com a areia do deserto deste país do médio oriente: o desrespeito pelos direitos humanos dos trabalhadores que colocaram de pé os estádios e as infraestruturas onde terá lugar o acontecimento maior do futebol mundial.

O emirado enfrentou uma série de críticas desde que foi escolhido país organizador do Campeonato do Mundo. Os ataques intensificaram-se este ano por causa das condições dos trabalhadores migrantes, dos direitos das mulheres e dos direitos da comunidade LGBT+.

Mais de 6500 trabalhadores perderam a vida na construção dos estádios e das infraestruturas desde que o Campeonato do Mundo foi atribuído ao Qatar, de acordo com dados de organizações internacionais como a 'Human Rights Watch'. Os migrantes, cerca de dois milhões de pessoas, representam 95% de toda a mão de obra do país.

Cerca de um milhão de pessoas estão empregados na construção civil, enquanto perto de 100 mil são trabalhadores domésticos, de acordo com o Human Rights Watch. Estima-se que tenha sido contratados 30 mil trabalhadores estrangeiros  para ajudar na construção dos estádios. A maioria provenientes do Bangladesh, India, Nepal e Filipinas.

Muitos mais migrantes têm sido explorados, não pagos, forçados a trabalhar, quando o Qatar era, no mais longínquo sonho, uma terra de oportunidades. Um país recheado de arranha-céus e centros comerciais luxuosos, mas em que os trabalhadores que os construíram nunca vão poder ter condições para almejar algum luxo semelhante.

Trabalham em condições aterradoras, com temperaturas a rondar os 50 graus. "Não é fácil. O calor atinge-te e parece que estás a morrer", refere Ibrahim, trabalhador originário do Quénia, citado pela France 24.

São prisioneiros do deserto, sem meios de transporte. Vivem em condições deploráveis, sem saneamento, e longe dos sonhos prometidos a quem vem de fora em busca de um futuro melhor. Não têm direito a folgas e acumulam salários em atraso, alguns estão mesmo um ano sem receber. Chegam ao Qatar através de agências com promessas de trabalho, onde são investidas todas as suas economias. Sem passaporte, que fica nas mãos dos patrocinadores e empregadores, vêem-se obrigados a trabalhar de sol a sol, perante ameaças de deportação, caso não cumpram ou demonstrem qualquer sentimento de revolta.

Sobre o número de mortes, o governo do Qatar diz que é proporcional face ao tamanho e à demografia da população trabalhadora. "No entanto, cada vida perdida é uma tragédia, e nenhum esforço é poupado na tentativa de evitar todas as mortes em nosso país”, disse o governo do Qatar em comunicado.

O mesmo responsável acrescentou que todos os cidadãos e estrangeiros têm acesso a cuidados de saúde gratuitos, e que tem havido um declínio na taxa de mortalidade entre os trabalhadores na última década devido às reformas de saúde e segurança no sistema de trabalho.

Explicação para as mortes

Grande parte das mortes é atribuída a causas naturais, como insuficiência cardíaca ou respiratória. O 'The Guardian', cruzando várias fontes governamentais, refere que outras causas de morte foram provocadas por acidentes de trânsito, acidentes de trabalho e suicídio.

Mais de 6500 trabalhadores, originários de países como o Sri Lanka, o Bangladesh, Nepal, Índia e Paquistão morreram desde que o Mundial foi atribuído ao Qatar

Conquistada o direito de organizar o Mundial, o país investiu 'faraonicamente' em infraestruturas, com destaque para a construção de um novo aeroporto, novas estradas, e oito estádios. Só que por cada construção foi derramado sangue migrante. De acordo com uma investigação do jornal britânico 'The Guardian', cerca de 12 migrantes morreram por semana desde que a organização da competição foi atribuída ao país.

5927 dos óbitos são originários do Índia, Bangladesh, Nepal e Sri Lanka, a que se somam mais 824 mortes de trabalhadores paquistaneses, isto no período entre 2010 e 2020.

Haverão, no entanto, bastantes mais. O ‘The Guardian’ detalha que o total de mortes é ainda superior, já que não inclui as vítimas mortais de países como as Filipinas e o Quénia, nem as mortes ocorridas nos últimos meses de 2020. Muitos são os que questionam os motivos para a morte de indivíduos aparentemente saudáveis.

Um trabalhador em perspetiva num dos estádios onde vai decorrer o Mundial do Qatar

O indiano Madhu Bollapally, de 43 anos deixou a Índia para aceitar um emprego no Qatar, deixando para trás a mulher Latha e o filho Rajesh de 13 anos. Nunca mais mais foi visto.

1276 euros foi a compensação que a família de Bollapally recebeu após a sua morte no Qatar

Numa noite em 2019, quando o seu companheiro de quarto regressou ao dormitório, encontrou o corpo de Bollapally no chão. Como em outros casos de mortes súbitas e inexplicáveis, a sua morte foi atribuída a causas naturais. O trabalho de seis anos valeu à família uma compensação de 114,000 rupias. Cerca de 1276 euros. Citado pelo 'The Guardian', o filho não tem a mínima ideia sobre a razão para o pai ter falecido: "Não tinha problemas de saúde, não havia nada de errado com ele."

Iniciativa 'Cards of Catar'

Numa forma de chamar a atenção para a realidade no Qatar, onde milhares de migrantes morreram ou ficaram feridos na construção das infraestruturas para o Mundial, a plataforma Blankspot revela o que se passa por detrás das estatísticas.

Através de cartões de futebol, é contada a história de trabalhadores migrantes que faleceram, e o seu destino. "Esses trabalhadores não são apenas estatísticas, as suas histórias precisam ser ouvidas", refere no site Martin Schibbye, editor-chefe e cofundador da Blankspot.

Que país é o Qatar, o apogeu da influência do dinheiro?

O emirado do Qatar não é mais do que uma pequena península com um território reduzido, mas gigante economicamente. Faz fronteira com a Arábia Saudita e é separado por um estreito do Golfo Pérsico do Bahrein. A riqueza provém dos lucros obtidos através da exportação do petróleo e do gás natural.

A influência do país no futebol tem sido cada vez mais afirmativa, com destaque para o PSG,  clube onde a realizada Catari têm investido de forma massiva desde 2011. Foi no final de 2010, que o mundo do futebol ficou chocado com a atribuição do Mundial ao país.

Os pesos dos petrodólares acabaram por ser decisivos na decisão da FIFA, num país que tinha a capacidade financeira ilimitada para construir oito estádios, dotados do maior luxo e comodidade e com as infraestruturas necessárias.

A decisão acabou envolta em polémica e o calor intenso que é sentido no país no verão levou a que o Mundial passasse para o inverno, algo inédito na história da competição. Foram levantadas suspeitas em relação à eventual compra de votos, devido a alegado esquema de corrupção envolvendo o Catari Mohammed bin Hammam. O antigo presidente da Confederação Asiática de futebol, teria pago cerca de 4,4 milhões de euros para que várias pessoas apoiassem e votassem na candidatura do Qatar.

Uma antiga funcionária da candidatura catari admitiu que vários dirigentes africanos receberam cerca de 1,5 milhões de euros para que apoiassem e votassem a favor e o FBI investigou um pagamento de 1,8 milhões de euros, com origem no Qatar, ao tobaguenho Jack Warner, na altura líder da Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caraíbas (CONCACAF) e vice-presidente da FIFA.

Um erro chamado Qatar

Joseph Blatter

12 anos depois da atribuição do Mundial, são várias as vozes que se levantam contra aquilo que muitos consideram ter sido um erro. Mesmo os que estiveram por trás da decisão.

"O Qatar é um erro, não foi a decisão mais acertada. Assumo a minha responsabilidade como presidente da FIFA naquela altura. O futebol e o Mundial são grandes demais para isso", disse Joseph Blatter, na altura presidente da FIFA, quando o Mundial foi atribuído ao Qatar, em entrevista ao jornal "Schweiz".

Também treinadores de renome se mostraram críticos em relação à realização da prova naquele país. É o caso de Jurgen Klopp, treinador do Liverpool. "Nem tudo é mau. Mas a maneira como as coisas aconteceram não foi correta. Agora é deixar os jogadores jogarem. Todos deixámos que isto acontecesse. Vocês [jornalistas] mais do que eu, mas todos deixámos. Na altura, já estava claro aquilo que ia acontecer. As pessoas diziam: 'É difícil construir estádios no Qatar porque é preciso fazê-lo no verão e estão 50 graus'. Isso não é bom para seres humanos. Na verdade, é impossível. Ninguém pensou nisso, acho que naquela altura ninguém falou disso sequer", disse.

Boicote ao Mundial do Qatar

Uma manifestação pelos direitos humanos dos trabalhadores migrantes no Qatar

Uma manifestação pelos direitos humanos dos trabalhadores migrantes no Qatar[/caption]

Nunca como agora, a poucos dias do início do Mundial, se levantaram tantas vozes contra uma competição que já está ferida de morte antes do seu arranque.

As graves violações aos direitos humanos no Qatar parecem ter unido o Mundo contra este campeonato. Em França, por exemplo, foram várias as cidades que anunciaram que não vão colocar ecrãs gigantes em fanzones', para que os adeptos possam acompanhar os jogos. Foram os caso de Lille, Bordéus, Estrasburgo e Paris.

"É impossível para nós ignorarmos os muitos alarmes das ONG's sobre o abuso e exploração de trabalhadores migrantes", disse a presidente da Câmara de Estrasburgo Jeanne Barseghian.

Já a antiga estrela de futebol, Eric Cantona, declarou que nem sequer vai assistir ao evento. (…) O Qatar não é um país de futebol. Não há fervor, não há paixão. (…) é uma aberração ecológica, com o ar condicionado nos estádios. Que loucura, que estupidez! Mas, acima de tudo, o horror humano, com as milhares de mortes durante a construção dos estádios, só para entreter a plateia durante um mês. E ninguém quer saber. (…) Pessoalmente nem vou ver os jogos", acrescenta.

Também há seleções que vão demonstrar toda a sua indignação na própria competição. No caso da seleção da Dinamarca, a Hummel, marca desportiva que equipa a seleção nórdica, revelou que todos os equipamentos vão servir de protesto contra a violação dos direitos humanos no Qatar. Há um equipamento que será todo preto por luto às vítimas.

Face ao exemplo vindo de fora há quem pretenda que as mesmas medidas sejam implementadas nas cidades portuguesas durante a competição. A Associação Frente Cívica disse em comunicado ter pedido às câmaras municipais de Lisboa e do Porto que “boicotem” o Mundial2022 de futebol, em protesto contra “a corrupção e as violações de direitos humanos” no Qatar.

Em cartas enviadas na terça-feira, a Frente Cívica defendeu que o boicote iria alinhar as duas principais cidades do país "com as melhores práticas de condenação da violação dos direitos fundamentais que nos constituem enquanto sociedade".

As cartas, assinadas pelo presidente da Frente Cívica, Paulo de Morais, e pelo vice-presidente João Paulo Batalha, recordam ainda “a opressão a que são sujeitas as mulheres e as minorias sexuais no Qatar”.

"A nossa posição é o resultado da constatação das demasiadas irregularidades, e dos crimes cometidos na organização do Mundial (…), Portugal, que é um pais, que vive intensamente o futebol não pode branquear esses abusos, e pelo amor ao futebol devemos ser exigente com as instituições e os regimes", começou por dizer João Paulo Batalha em declarações ao SAPO Desporto, defendendo ainda uma tomada de posição mais veemente por parte das autoridades políticas em relação ao que considera ser um campeonato "banhado a sangue."

João Paulo Batalha: "Este ano não há nada para celebrar, este Mundial resulta de um pacto corrupto entre a FIFA e o QATAR e está banhado em sangue."

"(…) Este ano não há nada para celebrar, este Mundial resulta de um pacto corrupto entre a FIFA e o Qatar e está banhado em sangue. (…) As entidades devem reagir. Os municípios impedindo a visualização coletiva dos jogos, a nível do governo deve ser tomada uma posição de repúdio", defende.

"Não devemos ter representantes políticos no Mundial. Do ponto de vista da Federação Portuguesa de Futebol também esperaria um boicote. Houve algumas seleções a fazerem protestos simbólicos, são pouco mais do que isso, tentando compensar uma cumplicidade estrutural com a FIFA e o evento", finalizou João Paulo Batalha.

Descriminação sexual num país em que a homossexualidade é crime

Iniciativa para a promoção dos direitos da comunidade LGBT+

Iniciativa para a promoção dos direitos da comunidade LGBT+créditos: AFP or licensors[/caption]

As leis do Qatar continuam a descriminar mulheres, lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros (LBBT). A relação entre indivíduos do mesmo sexo é punida com pena de prisão entre um e três anos. O sexo fora do casamento também é punido com flagelação, ou pena de morte se o individuo for casado. No caso das mulheres a gravidez serve de evidência de sexo extraconjugal, e mulheres que denunciem que foram violadas podem ser acusadas por sexo consensual.

A poucos dias do arranque do Mundial, Khalid Salman, embaixador da competição, classificou a homossexualidade como "um distúrbio mental".

Num excerto de uma entrevista, Salman, antigo futebolista, afirmou que “homossexualidade é ‘haram’ [proibido]”, isto antes de ser interrompido por um assessor, acrescentou: “’E ‘haram’ porque é um distúrbio mental”.

Recorde-se que no passado mês de setembro, o emir do Qatar, o xeque Tamim bin Hamad al-Thani, prometeu, perante a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque, um Mundial sem discriminação, numa tentativa de tranquilizar a comunidade LGBT+.

Também Gianni Infantino, presidente da FIFA, numa resposta às preocupações sobre o respeito pelos direitos das mulheres e da comunidade LGBT+ durante a competição, reiterou que “todos serão bem-vindos, independentemente da sua origem, formação, religião, género, orientação sexual ou nacionalidade” e considerou que o torneio será “o melhor de sempre, dentro e fora do campo”.

Nas Mohamed, o primeiro catari assumidamente homossexual

Nas Mohamed nasceu no seio da comunidade privilegiada, num país em que os cataris ou os nativos gozam de várias regalias, e representam apenas 13% da população. São apenas cerca de 313 mil, numa população de 2,8 milhões de habitantes. Sentindo que estava destinado a casar-se por conveniência, foi durante a adolescência que percebeu que não seria vida para ele. Com medo de ser alvo de perseguição, Mohamed tentou escondeu a sua orientação sexual.

Nas tornou-se conhecido nas notícias por ser o primeiro homem Catari, assumidamente gay. Num país, em que a homossexualidade é crime, as punições são mais severas para os cataris, do que para os estrangeiros ou visitantes.

De acordo com a organização de defesa dos direitos LGBT Human Dignity Trust, o Qatar também opera uma interpretação da lei Sharia "na qual é tecnicamente possível que homens que se envolvam em intimidade com pessoas do mesmo sexo sejam condenados à morte".

"Há algumas evidências limitadas da aplicação da lei nos últimos anos, no entanto, os relatórios são raros", diz a Human Dignity Trust.

De acordo com uma reportagem da cadeia SBS News, Nas viajou para os Estados Unidos há 11 anos para estudar medicina, quando tinha 24 anos e não mais regressou. Sabendo que ia ser alvo de perseguição pela sua orientação sexual, requisitou asilo político e em 2017 o seu pedido foi aceite.

A atribuição do Mundial ao Qatar acabou por servir de incentivo para que Nas se pudesse assumir publicamente, pois impressionou-o o porquê de ninguém estar a falar sobre os direitos da comunidade LGBT+. "Eu estava a tentar chamar a atenção sem sair do armário", disse.

Seleção australiana uniu esforços num vídeo de apoio aos migrantes do Qatar

A Austrália, uma das seleções qualificadas para o Mundial, uniu-se em torno da causa dos migrantes no Qatar. Num testemunho através de um vídeo com a participação de vários jogadores, os 'Socceroos' exigiram a implementação de reformas na área dos direitos humanos, incluindo a descriminalização das relações entre pessoas do mesmo sexo, antes do Campeonato do Mundo.

Num vídeo publicado nas redes sociais, vários jogadores expressaram preocupação com o tratamento dos trabalhadores migrantes, na sequência de uma série de alegações da morte de milhares deles na construção de infraestruturas para a competição.

Também as mulheres enfrentam situações de descriminação no país. A Amnistia Internacional explica que estas se regem sob as regras da “tutela masculina”, atribuída geralmente ao marido, pai, irmão, avô ou tio - as mulheres vivem assim dependentes de um homem. Precisam de autorização do tutor para tomar decisões como casar, estudar no estrageiro, desempenharem funções no governo ou para viajar.

A lei também não as protege, caso queiram divorciar-se do marido. As mulheres divorciadas estão impedidas de ficar com a guarda dos filhos.

Que mudanças pretende implementar o Qatar?

A face dos trabalhadores migrantes no Qatar

Substituição do Sistema Kafala

Em 2021, um relatório da Human Rights Watch referiu que os trabalhadores estrangeiros enfrentaram meses e meses de salários não pagos e trabalho exaustivo. Nos últimos tempos, o governo do Qatar iniciou um conjunto de reformas com vista à melhoria das condições dos migrantes, substituído assim o sistema Kafala, que permite um poder extremo dos empregadores sobre os trabalhadores..

O 'Kafala system' permite o abuso e a exploração dos migrantes. Sem direito a cidadania, os trabalhadores viam-se assim privados dos mais básicos direitos humanos. A empresas contratantes serviam-se do sistema 'Kafala', que se baseava em atrair os migrantes para o país, mas proibindo-os de deixar os seus trabalhos. Depois de pressões do estrangeiro. o governo do Qatar aboliu esses sistema e prometeu reformas laborais, assim que se feche a cortina sobre o Mundial em Doha.

O que tem feito o Qatar em matéria de direitos dos trabalhadores?

Em conjunto com a International Labour Organization, o governo do Qatar introduziu uma série de reformas, como a proteção salarial, garantindo que os empregadores paguem os seus funcionários a horas.

Em declarações à BBC, uma fonte do governo Catari garantiu que as reformas têm melhorado as condições dos trabalhadores migrantes no Qatar. "Foi feito um progresso significativo para garantir que as reformas sejam efetivamente aplicadas", começou por dizer, afirmando ainda "que o número de empresas que quebrem as regras tende a diminuir à medida que a fiscalização aumente".

Migrantes trabalham num dos estádios do Qatar

Ainda assim, o governo opôs-se à criação de um fundo de indemnização para trabalhadores mortos, ou feridos. O fundo iria aumentar as compensações existentes e incluiria aqueles que ainda pretendem reaver os salários não pagos. As famílias dos trabalhadores que morreram em circunstâncias nunca investigadas pelas autoridades do Qatar também seriam compensadas, permitindo que quem perdera um ente querido se alimentasse e enviasse os seus filhos para a escola.

Na antecâmara do Campeonato do Mundo Ali bin Samij al-Marri, ministro do trabalho do país, declarou em entrevista exclusiva à AFP que "este pedido (…) de uma campanha de compensação é uma estratégia de comunicação" e que o país já conta com um fundo para os trabalhadores mortos, ou feridos, referiu ministro Al-Marri em entrevista.

A Amnistia Internacional e a Human Rights Watch lideraram os apelos para a FIFA e Qatar para que seja criado um fundo de compensação de 439 milhões de euros – o equivalente aos prémios do Campeonato do Mundo.

A FIFA garantiu que há um "diálogo contínuo" sobre o assunto, mas, no primeiro comentário público do governo, Marri disse que a proposta é inviável.

"Cada morte é uma tragédia", reafirmou o ministro do Trabalho, mas, acrescentou, "não há qualquer critério para criar esses fundos". "Onde estão as vítimas, vocês têm os nomes das vítimas? Como se consegue obter esses números?", questionou.

No mês passado, o emir do Catar manifestou que o país enfrenta "uma campanha sem precedentes". "Não querem que um país pequeno, um país árabe, um país islâmico, organize o campeonato do mundo", disse, acrescentando. "Conhecem muito bem as reformas que foram feitas, mas não as reconhecem porque têm motivações racistas", concluiu.

O Qatar recebe o Mundial de futebol, no qual participará a seleção portuguesa, entre os dias 20 de novembro e 18 de dezembro.