Como muitos atletas por todo o mundo, Diogo Ganchinho viu a sua rotina de treinos fortemente afetada pela pandemia da COVID-19.
O ginasta, afastado do trampolim há mês e meio, conta, em conversa com o SAPO Desporto, os desafios que o confinamento lhe trouxe nos últimos meses, tudo numa altura em que o atleta do Sporting ainda lutava pela sua terceira participação em Jogos Olímpicos.
O atleta de 32 anos, campeão europeu de trampolim individual sénior em 2018, admite que o mais complicado nesta quarentena tem mesmo sido as saudades da família, situação que vai sendo colmatada graças as tecnologias, tecnologias estas que têm, na sua opinião, ajudado a reatar contactos com velhos amigos durante este período.
SAPO Desporto: Há quanto tempo é que já não saltas num trampolim?
Diogo Ganchinho: "Desde o dia 16 de março, há um mês e meio"
SD: Como é que tens mantido a forma afastado do trampolim?
DG: "É sempre difícil a parte do treino técnico… Muita energética, muito estudo, ver vídeos de outras competições e treinos, análise… Depois o exercício físico com várias componentes como o treino de flexibilidade, estabilidade corporal e também o treino de força, na medida do possível, em casa, um pouco na rua, mas aqui perto. E sobretudo sabermos que não temos condições para estar a treinar ao alto nível, mas é manter a condição física, esse é sobretudo o objetivo"
"Mas isto também tem coisas boas… ligamos a amigos com os quais já não falávamos há muito tempo, e com os quais às vezes adiávamos cafés por tudo e por nada."
SD: Qual é a maior dificuldade que estás a sentir?
DG: "A maior dificuldade é não estar com as pessoas e com aqueles de quem gostamos. O meu pai fez 60 anos e eu não consegui vê-lo nesse dia. Tive cá um dos meus irmãos e isso foi muito bom, esteve cá 15 dias comigo. Mas isto também tem coisas boas… ligamos a amigos com os quais já não falávamos há muito tempo, e com os quais às vezes adiávamos cafés por tudo e por nada. Nesse aspeto acho que tem vindo a unir as pessoas. A maior dificuldade é mesmo as saudades das pessoas de quem gostamos e da nossa família"
SD: Essa solidão acaba por afetar também os treinos? Com companhia há sempre outra motivação…
DG: "Claro, é assim que funciona em quase todos os desportos. Apesar de ser um desporto individual nós temos uma equipa e, por acaso, é uma das melhores equipas do mundo. Portanto treinar com eles é sempre uma inspiração. Claro que nos faz falta e calculo que o regresso ao treino não seja propriamente em grupos, deverá ser esquematizado de forma a haver o mínimo contacto possível"
SD: Explica-nos o teu dia-a-dia em isolamento.
DG: "O segredo é tentar manter as rotinas e nós os atletas nesse aspeto temos alguma ‘skill’ pelas nossas rotinas e pelo nosso dia-a-dia que nos permite continuar a ser coerentes, acordar a certa hora, fazer as refeições todas, não saltar refeições, fazer um sono tranquilo e às horas normais…
De manhã faço sempre um treino de flexibilidade, depois do pequeno-almoço, e aproveito para ver alguns vídeos, para ler… há sempre coisas para fazer. Acabo por cozinhar bastante, algo que gosto muito de fazer e depois à tarde volto aos treinos, às vezes faço dois períodos [de treino] à tarde, às vezes faço só um, depende. Mas são treinos sobretudo para nos mantermos numa boa condição física, porque não podemos esperar sair desta situação na nossa melhor forma. Depois tiro sempre um período do dia para falar com amigos, para ligar ou fazer videochamada e tenho sempre esse período como parte da minha rotina porque ajuda-nos bastante irmos falando com os nossos amigos e com a minha família. Depois à noite um pouco mais de tranquilidade, às vezes vejo o Bruno Nogueira, porque também precisamos desse humor nestas alturas mais difíceis e basicamente tenho passado o dia desta forma"
SD: De que forma é que o Sporting tem apoiado durante este período?
DG: "O Sporting tem estado a trabalhar para garantir o regresso à atividade e, portanto, nós temos sempre através do Gabinete Olímpico o apoio da nutrição, do psicólogo de fisioterapeutas, que esta sempre à nossa disposição, mesmo em confinamento. E acredito que estejam a trabalhar para chegarem o mais rapidamente possível a um regresso progressivo à normalidade, por isso têm neste momento um trabalho difícil"
Adiamento dos Jogos Olímpicos foram "boas noticias no sentido em que deu algum oxigénio aos atletas"
SD: O adiamento dos Jogos Olímpicos e dos Campeonatos da Europa veio mexer com o calendário desportivo. Como é que viveste esta situação numa altura em que ainda lutavas pela qualificação olímpica?
DG: "Ainda me faltava uma prova, que em principio será realizada para o ano. Para mim foi uma boa notícia no sentido em que seria de facto angustiante para os atletas sentirem que iam ter de estar preparados com a ansiedade ligada à incerteza [da realização das provas], que mesmo para quem não é atleta é mau. Eu acho que foram boas noticias no sentido em que deu algum oxigénio aos atletas, para terem tempo para se prepararem para a competição, porque se tivéssemos de faze-lo à pressa sem o mínimo de preparação seria psicologicamente bastante difícil e podia também ter consequências negativas a nível físico. Acho que foram as decisões certas…
A Federação e o Comité Olímpico têm trabalhado para que as coisas todas corram com calma e naturalidade. Não queríamos apressar a resolução de um problema sobre o qual ainda não sabemos tudo. O objetivo neste momento é a saúde das pessoas, mas já com alguma expetativa no sentido de um regresso progressivo, em condições de segurança, porque estamos também mentalizados que é algo com que vamos ter de lidar… Temos de encontrar as soluções possíveis para que se comece a regressar progressivamente à normalidade"
DG: Além dos ‘lives’ do Bruno Nogueira, o que é que tens visto, lido, ouvido nos tempos livres?
DG: "Estou a ler um livro agora que é o ‘Nova Inteligência’ [Livro de Daniel H. Pink]. Procuro consumir o máximo de conteúdos em direto dos artistas, vi há pouco tempo um ‘live’ do DJ Blue, que é alguém que toca o tipo de música que eu gosto e vejo esses artistas a fazerem as performances ‘live’ até porque tenho essa sensibilidade, no sentido em que um dos meus irmãos é músico e também está a passar por um situação complicada e portanto tudo o que ajude a promover artistas nesta fase difícil eu tento consumir. Vi o ‘Tiger King’, acabei por ver isso. Vi um documentário que é o ‘Kissed by God’ que fala sobre a vida do Andy Irons, que é sobre um surfista que na altura rivalizou com o Kelly Slater. E consegui também ver o filme que ganhou o Óscar de melhor filme do ano, o Parasitas"
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