O treinador e analista de futebol, Rafael Pacheco, olha para a evolução do Benfica de Roger Schmidt até ao momento ao longo desta segunda temporada do treinador germânico ao leme das águias.
Não há como fugir a algumas dúvidas nas exibições do Benfica da presente temporada. Não é que o Benfica da temporada passada fosse perfeito, mas eram uma imagem de marca bem vincada de Roger Schmidt e das ideias do treinador alemão. Com as saídas e entradas do mercado de transferências deste verão, as águias parecem ter mudado um pouco.
Inicialmente os encarnados queriam praticar o mesmo tipo de futebol que praticavam na temporada passada, só que agora sem Gonçalo Ramos, Grimaldo ou ainda Enzo Fernandez - é curioso que são nestas três posições onde, até ao dia de hoje, existe mais incertezas sobre qual é o seu dono. Pior que isso, tentar jogar o mesmo futebol com jogadores de características completamente diferentes.
O jogo de Schmidt é muito focado no gegenpressing, um estilo de pressão específico, e também numa verticalidade que não se vê frequentemente em Portugal, ainda que tenha modelado esta verticalidade em consequência da sua equipa - que tirou o melhor proveito de todas as qualidades de Grimaldo. O Benfica era vertical mas mais moderado do que as restantes equipas de Roger Schmidt.
Para além disso, como já abordamos, o Benfica era uma equipa que pressionava de uma forma específica, alta, compacta e muito agressiva e rápida. Eram 11 jogadores que trabalhavam como uma equipa e que se ajudavam entre si. Esta pressão fez do Benfica uma das equipas mais atrativas de assistir na temporada passada durante determinado período.
Porém, este não é o mesmo Benfica. Morato defende melhor que Grimaldo e talvez seja um melhor equilíbrio, porém não oferece a tomada de decisão nem a amplitude e movimentos de rotura que Grimaldo oferecia. Nenhum dos avançados encarnados se conseguiu afirmar de vez no plantel benfiquista, uma vez que nenhum deles dá a mesma segurança defensiva que Gonçalo Ramos deu - nunca é demais reforçar a sua inteligência tática e a importância no Benfica para além dos golos.
Contudo, Di Maria é o jogador que mais faz diferença nesta equipa. Para o bem e para o mal...
Por um lado sabemos que é o jogador que pode mudar o jogo dos encarnados a qualquer momento com um último passe ou um remate. Sabemos que foi um jogador fora de série e inclusive um dos melhores da sua geração, não esquecendo que foi campeão mundial há pouco mais de um ano atrás pela sua seleção. Todavia, já não tem a capacidade física de outrora e não tem capacidade para fazer 90 minutos da exigência física do modelo de jogo de Roger Schmidt, ao que o treinador alemão se tentou adaptar em consequência disso mesmo. O resultado foi uma pressão totalmente desajustada e sem nexo dos encarnados, com qualquer adversário a sair da pressão encarnada com enorme facilidade. João Mário não é também o melhor neste momento, porém a equipa conseguia compensar um ou outro deslize individual. A primeira fase desta época encarnada foi deficitária por isto mesmo e, com o passar do tempo, vão se sentindo algumas melhorias.
Com a recuperação de Bah, Aursnes (depois de ser lateral esquerdo e direito) parece ter subido no terreno de jogo para ala esquerdo - onde tira o seu melhor rendimento - deixando João Mário no banco de suplentes. Di Maria ganhou concorrência direta para a sua posição com Rolheiser e o campeão mundial parece também ter evoluído nos aspetos defensivos, principalmente naquilo que a atitude e compromisso dizem respeito. Não fará os 90 minutos que antes fazia, mas fará menos tempo com melhor qualidade.
Falta perceber se Florentino é para ficar no meio-campo encarnado. Kökçu não é problema, mas nem sempre é solução. João Neves é o único certo do meio-campo que deriva da falta de conquista de bolas (sem Florentino) com a falta de critério na posse de bola (sem Kökçu).
Para além disso, este Benfica precisa de ter ainda mais bola que na temporada passada se quiser tirar proveito das qualidades de Di Maria. Enquanto que o argentino é contra natura as ideias do seu treinador, Tiago Gouveia parece ser uma opção mais viável. No entanto, também Roger Schmidt, apesar de não o gostar de fazer, também tem de se adaptar aos seus jogadores. Com mais dificuldade ou menos dificuldade, hoje é o dia que mais perto está de encontrar o equilíbrio. Não é o melhor Benfica, mas é muito melhor que no início da época.
A pressão começa a melhorar, mas ainda falta mais critério nos momentos ofensivos. Falta a amplitude do lateral esquerdo e não existe a mesma verticalidade da temporada passada - aliás, têm-se observado falta de qualidade em momentos de transição ofensiva. A máquina de Roger Schmidt nunca estará 100% oleada e nunca será igual à da temporada passada, mas começa a ser mais parecida.
Há mais Rogerball, porém ainda está a meio do caminho.
PS: Rafael Pacheco, treinador e analista de futebol, tem nas bancas o livro 'Rogerball - O Benfica de Schmidt', onde analisa a época do Benfica em 2022/23, que levou os encarnados ao título de campeão nacional e aos quartos de final da Liga dos Campeões.
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