Considerado um ícone da Bossa Nova, o compositor brasileiro João Gilberto, que morreu este sábado aos 88 anos, no Rio de Janeiro, abriu portas à internacionalização da música brasileira e influenciou nomes como Caetano Veloso e Chico Buarque.
Apesar de ser adepto do Vasco da Gama e de gostar muito de futebol, João Gilberto nunca gostou de opinar sobre a modalidade, considerando mesmo que essa não era a sua 'terra'. Numa entrevista à revista Veja em junho de 2010, João Gilberto assumiu que era 'torcedor' do Vasco da Gama, mas só "um pouquinho", e não poupava elogios a Neymar quando o internacional brasileiro começava a brilhar no Santos.
"Eu sou Vasco. Torço só um pouquinho. No momento, estou gostando muito do Santos. Aquele Neymar é fabuloso. Não tem nem Robinho. É notável aquele cara. Que beleza vê-lo jogar. É o cúmulo o Dunga não escalá-lo. Você já viu isso? É da gente, é menor, é um negócio esquisito. Tem coisas crônicas no time do Brasil. Não gostam de ritmo. Eles põem o pé na bola, pensam que são os donos da bola e que têm um ano para ficar com ela no pé. Vem um argentino e toma. Os caras estão chutando de primeira. Tão primário isso, mas brasileiro é brasileiro. Como lhe disse, não posso ficar dando palpite porque não tenho esse direito. Não considero que aqui seja minha terra", disse João Gilberto à referida publicação.
A notícia do seu falecimento não passou despercebida ao Vasco da Gama e nas redes sociais o emblema carioca deixou uma mensagem sentida ao famoso compositor brasileiro e 'vascaíno' de coração.
"O dia de hoje certamente foi triste para os fãs da música brasileira. Faleceu aos 88 anos o vascaíno e pai da Bossa Nova, João Gilberto. Deixamos aqui nossos sentimentos aos familiares, amigos e fãs", pode ler-se no comunicado publicado na página oficial do Twitter do Vasco da Gama.
Apesar de ter nascido no estado brasileiro da Bahia, nordeste do país, João Gilberto era um conhecido adepto do Vasco da Gama, clube do Rio de Janeiro fundado em 1898 por emigrantes portugueses e que 'revolucionou' o futebol brasileiro quando integrou pela primeira vez jogadores negros e pobres nas suas equipas numa altura em que o futebol era um desporto de elites.
Em resposta a esta tentativa do Vasco da Gama de quebrar as barreiras da discriminação social e racial, os outros clubes do Rio de Janeiro juntaram-se para expulsar os 'camisas pretas' da liga. Como condição para regressar aos campeonatos brasileiros, o Vasco da Gama foi obrigado a construir um estádio próprio e em 1927 o sonho tornou-se realidade pela mão do arquiteto português Ricardo Severo com a construção do estádio de São Januário com dinheiro dos emigrantes portugueses.
Recorde a reportagem do SAPO Desporto de 2014: "A história do Vasco, o clube mais português do Brasil"
Nascido em 1932 no estado brasileiro da Bahia, nordeste do país, João Gilberto Pereira de Oliveira ficou mundialmente conhecido como um dos pais da Bossa Nova, um estilo musical derivado do samba e com influências do jazz, que surgiu no fim da década de 1950 pelas mãos do próprio, de Tom Jobim, Vinícius de Moraes e de jovens cantores e compositores da classe média do Rio de Janeiro.
Em março de 1959, Gilberto lançou o álbum "Chega de Saudade", considerado por muitos o marco inicial da bossa nova, abrindo caminho para um novo estilo, fazendo uso apenas da voz e do violão.
Um ano depois, lançou "O Amor, o Sorriso e a Flor", contendo a célebre canção "Samba de Uma Nota Só" e em 1962 dividiu o palco com Vinícius de Morais, Tom Jobim e o grupo vocal Os Cariocas.
Apresentou-se no Festival de Bossa Nova, no Carnegie Hall de Nova Iorque, cidade onde fixou residência durante anos e onde lançou vários discos de sucesso.
Com a parceria com Stan Getz, o disco "Getz/Gilberto", que inclui o tema "Garota de Ipanema", recebeu um 'Grammy', considerado o Óscar da música, de melhor álbum em 1965.
Os últimos discos de João Gilberto foram "João, Voz e Violão" (2000), pelo qual foi distinguido com outro 'Grammy' na categoria 'Best World Music Álbum', e o CD "João Gilberto in Tokyo" (2004), segundo o portal de notícias UOL.
No entanto, e apesar de ser um dos artistas mais conceituados no Brasil, João Gilberto encontrava-se afastado dos palcos há mais de uma década.
A última vez que João Gilberto pisou os palcos foi em 2008, por ocasião das comemorações dos 50 anos da Bossa Nova.
Houve, nessa altura, uma expectativa de que o artista voltasse a atuar em novembro de 2011, numa digressão a decorrer no Brasil, intitulada "João Gilberto 80 anos - Uma Vida Bossa Nova".
No entanto, por motivos de saúde do músico, a primeira apresentação, que seria em São Paulo, viria a ser cancelada, assim como os restantes espetáculos agendados.
A decadência física, polémicas familiares, os problemas financeiros, ou contratos não concluídos fazem parte do conjunto de episódios que acabaram por marcar os últimos anos de vida do aclamado compositor brasileiro.
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