Cristiano Ronaldo é a nova estrela da Juventus e, consequentemente, da Serie A. Os recordes do internacional português são mais que muitos e todos eles bastante conhecidos. Dos golos aos troféus, quer individuais quer colectivos, passando pelo título de Campeão da Europa. É um jogador de qualidade reconhecida por colegas, adeptos, técnicos e dirigentes. Numa altura em que muito se fala de Portugal e da Liga Italiana, é boa hora para contar a história (caricata) do primeiro português que jogou em Itália. Um jogador que na realidade até era escultor e que viajou para Roma no início do século XX para estudar em Roma.
Roma, 1907
Francisco dos Santos acordou uma bela manhã para passear o seu cão - um fox terrier - e deu por si no Parque dos Gamos. Ali encontra a equipa de futebol amador da Lazio, em pleno treino. Foi assim, por acaso, que Francisco dos Santos se juntou ao treino dos laziales e consequentemente se tornou no primeiro jogador português a jogar do estrangeiro.
O caminho até ali
Nasceu em Paiões, na freguesia de Rio de Mouro, no concelho de Sintra, quando o calendário marcava o dia 22 de outubro de 1878. Ingressou ainda novo na Casa Pia de Lisboa e foi ali que desenvolveu as duas grandes vocações: a escultura e o futebol.
Quanto à escultura, foi a Casa Pia que o matriculou na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa em 1893. Quatro anos depois, inscreve-se no curso de Escultura e é aqui que começa a viagem que o levaria à Lazio. Em 1903, ganha uma bolsa de estudo do Estado Português para estagiar em Paris. Da capital francesa segue para Roma por conta da Casa Valmor novamente com uma bolsa de estudo, para completar as suas obras.
Paris e Roma tiveram a honra de ter nos seus salões as obras de um dos mestres da estatuária portuguesa. Entre as mais conhecidas estátuas estão o Prometeu, O Homem do Leme, La Filie Prodigue, Pequeno Egípcio, Crepúsculo - este último ainda conservado no Museu Nacional de Arte Contemporânea no Chiado. Foi ainda o autor do busto oficial da República, em 1911, que se encontra na Câmara Municipal de Lisboa, e também da estátua do Marquês de Pombal, em parceria com António Couto.
O futebol
Mas, para completar a história de como chegou à Lazio, é necessário recuar mais uma vez no tempo. Ainda na Casa Pia, começou a jogar futebol, tinha na altura 14 anos. Fez parte da equipa que a 22 de Janeiro de 1898, venceu por 2-0 o Carcavelos Clube - na altura a mais forte equipa de Lisboa e até ai invencível.
Em 1904, tornou-se um dos fundadores do Grupo Sport Lisboa - que viria a dar origem ao Benfica, formado por antigos alunos da Casa Pia em conjunto com o Grupo dos Catataus. Quando em 1907 começou a aventura como jogador da Lazio, em Portugal ainda nem sequer existia uma liga nacional - só começou em 1934, mas em Itália o futebol já estava bastante organizado e desenvolvido.
A sua qualidade futebolística era inquestionável e foi isso mesmo que o tornou capitão de equipa, isso e a resiliência, passamos a explicar: num jogo disputado em Pisa, Francisco dos Santos chocou com um jogador da equipa adversária, o português partiu duas costelas, mas nem isso o arrancou de dentro de campo.
Em Roma, ficou conhecido por 'homem-cacto' pela sua estatura: 1,60 metros e 55 quilos. Mas isso não o impediu de fazer história em Itália, não só como o primeiro português a jogar no estrangeiro, mas também como o primeiro português a ser falado no jornal Gazetta dello Sport. Estávamos a 20 de Janeiro de 1908, e a crónica do desportivo italiano analisava o primeiro derby entre a Lazio e a Roma: "Em evidência estiveram o jovem Saraceni e o veterano Dos Santos, que com os seus 55 quilos foi, impressionante, dos melhores em campo..."
Também Mario Penacchia, no livro Storia della Lazio, fala do português ao dizer que, "Dos Santos é um jovem português que está em Roma para se tornar escultor. O seu físico é antiatlético por excelência, pois é pequeno, assimétrico, dir-se-ia um homem disfarçado de cacto, com aquele tufo de bigodes. Salta mais alto do que todos, é o primeiro a correr, o último a mostrar-se cansado e a render-se, é rápido, resistente, em suma, é um fenómeno através do qual, mais uma vez, a natureza parece querer dizer que nunca nos devemos fiar nas aparências".
Jogou na Lazio nas temporadas 1907/1908 e 1908/1909, daí volta a Portugal e veste a camisola do Sporting entre 1908 e 1911. Tornou-se sócio em dezembro de 1908 e representou os 'leões' como avançado e médio. Além disso, fez ainda parte dos primeiros Conselhos Técnicos do clube.
Mas, como nem todas as histórias têm um final feliz, Francisco dos Santos morreu precocemente aos 52 anos, a 27 de abril de 1930, vitimado por uma congestão.
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