O recente ataque de adeptos do Manchester United à residência do presidente do clube "é invulgar", garante o académico John Williams, e resultado do novo tipo de modelo económico no futebol da Liga inglesa.

"É invulgar no futebol inglês. Aconteceu no Manchester United porque muitos dos adeptos não gostam dos donos do clube e não gostam da direção que defende os proprietários", justificou o sociólogo da Universidade de Leicester.

O jornal The Sun publicou um vídeo, em janeiro, de um grupo de adeptos com a cara tapada, alegadamente membros da claque ‘Men in Black’, junto à residência de Ed Woodward, que atiraram uma tocha para dentro do jardim em sinal de descontentamento com a gestão e desempenho da equipa.

"Adeptos manifestarem a opinião é uma coisa, danos criminais e a intenção de pôr em risco vidas é outra. Não há, simplesmente, desculpa para isto", reagiu na altura o Manchester United, em comunicado, denunciando o caso à polícia.

Em causa está o descontentamento com o norte-americano Malcom Glazer, que adquiriu uma participação maioritária no clube em 2005, financiando a operação com endividamento que usou como colateral ativos do Manchester United.

"Isto é algo relativamente novo no futebol inglês. E está, definitivamente, ligado à ideia de que algumas pessoas entraram no futebol do estrangeiro para ganhar dinheiro, não para gerir o clube eficientemente e ganhar troféus, mas fazer lucro", garantiu Williams à agência Lusa.

O Manchester United já tinha protagonizado um caso semelhante em 2010, quando um grupo de adeptos confrontou Wayne Rooney à porta de casa para o dissuadir de assinar pelos rivais do City, o que acabou por não acontecer.

O sociólogo, autor do livro A Ascensão do Hooligan do Futebol Inglês, garante que não reflete a violência no futebol inglês, a qual tem vindo a decrescer, sobretudo na sequência do desastre de Hillsborough, em 1989, quando 96 pessoas morreram esmagadas devido à entrada forçada de adeptos no estádio.

"Fez o governo e a população em geral olhar de forma diferente para o futebol e os adeptos de futebol porque ficou claro, à medida que as histórias começaram a ser escritas sobre as pessoas que morreram. Ficou claro para aqueles que não eram fãs de futebol que os adeptos eram pessoas como eles. Eram muito normais, algumas mulheres e crianças morreram", explicou Williams.

A responsabilidade atribuída à polícia também resultou numa mudança na forma como a segurança passou a ser feita nos estádios de futebol, mas o principal impacto foi a forma como mudou a modalidade em Inglaterra e levou à criação da Premier League.

"A televisão via satélite estava com problemas e estava à procura de um novo produto cultural e o futebol inglês de alto nível estava à procura de uma mudança de cultura para tentar escapar ao hooliganismo. De certa forma, eles salvaram-se um ao outro", sugeriu o académico.

O futebol passou a ser um novo tipo de "evento cultural", mais exclusivo e atrativo para um grupo mais variado de pessoas, levando ao aumento dos preços dos bilhetes, que chegam a custar centenas de euros, argumentou.

"Pessoas foram excluídas, efetivamente, pelo preço. E na nova geração de estádios em Inglaterra, algumas das antigas identidades dos gangues de hooligans, com zonas específicas do estádio, começaram a desaparecer", acrescentou.

Para este académico, esta sucessão de fatores permitiu que o futebol inglês tenha beneficiado "de um novo começo".