A jurista Maria Cecília Anacoreta Correia, especialista em Direito Administrativo, disse hoje à agência Lusa que a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) pode alegar a impossibilidade de recolocar o Boavista na I Liga, mas terá sempre de indemnizar o clube.
«Temos uma sentença que declara nula a despromoção do Boavista à II Liga, o Boavista tem direito a executar essa sentença – a pedir que seja colocado na situação em que deveria estar se não tivesse sido despromovido – e as únicas hipóteses de não ser executada assim é invocar a impossibilidade absoluta de concretizar a sentença ou o grave prejuízo para o interesse público. Esta situação dá sempre direito a indemnização ao Boavista», explicou Maria Cecília Anacoreta Correia.
O Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS) rejeitou o recurso interposto pela FPF à decisão, em primeira instância, de declarar nula a reunião do Conselho de Justiça (CJ) que ditou a despromoção do Boavista à II Liga, devolvendo o processo para o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TACL).
Maria Cecília Anacoreta Correia reconheceu que não «será muito provável que haja uma inversão da decisão tomada pelo TACL», mas advertiu para a importância de «se perceber se nestes casos em que as decisões são tomadas por um juiz singular, de modo sumário, se deve seguir uma reclamação ou um recurso».
Em causa está uma uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, de junho último, sobre a obrigatoriedade de ser feita uma reclamação das decisões de um juiz singular, no prazo de 10 dias, e não um recurso para segunda instância, no prazo de 30.
«No fundo, juridicamente, o que me parece é que, depois do acórdão de uniformização de jurisprudência estar publicado em Diário da República, todos sabemos como deve ser interpretada a dúvida, mas nas situações anteriores não faz sentido o tribunal central exigir isso aos particulares, quando o próprio tribunal central emitiu acórdãos no sentido oposto», referiu.
No entanto, mesmo com a baixa do processo para primeira instância, Maria Cecília Anacoreta Correia considera que o TACL pode «decidir se há condições para se convolar o recurso, que o particular tenha posto», ou seja, converter o recurso numa reclamação para o plenário dos juízes.
«Eu julgo que esta decisão vai voltar à primeira instância e o tribunal deveria ser confrontado com esta questão, de ver se estão ou não preenchidos os requisitos para se convolar o recurso numa reclamação e julgo que deve fazer uma interpretação flexível do prazo», sublinhou.
A especialista em Direito Administrativo admite que esta conversão do recurso em reclamação para a conferência de juízes da primeira instância «é possível e defensável mediante o princípio do acesso à Justiça».
«Afinal, a deliberação do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol era ou não nula?», questionou. «Houve um juiz que disse que era nula, mas foi um juiz singularmente, e nós queremos saber se é ou não nula, é uma questão que tem uma importância jurídica fundamental e uma importância social muito relevante», frisou.
Caso não seja possível, Maria Cecília Anacoreta Correia, sem conhecer o acórdão em detalhe, defende que, «em abstrato, a única hipótese para recurso de decisões em tribunais de segunda instância são recursos excecionais de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, que têm de estar limitados a uma questão de Direito».
«Aqui já está decidida a questão de Direito, sobre se deveria ser uma reclamação ou um recurso. A questão que ainda fica por decidir é saber se essa interpretação deve servir para os recursos interpostos antes da uniformização ou apenas para os posteriores», concluiu.
Em 28 de fevereiro, o Boavista foi notificado pelo TACL da decisão de considerar nula a reunião do CJ da FPF que confirmou a sua despromoção à II Liga.
O CJ reuniu-se a 04 de julho de 2008 e teve uma segunda parte, já sem o presidente e vice-presidente, em que foi confirmada, nomeadamente, a descida de divisão do Boavista, por alegada corrupção, que havia sido determinada pela Comissão Disciplinar (CD) da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), no âmbito do processo “Apito Final”.
Desse modo, os conselheiros presentes nessa polémica reunião do CJ da FPF não acolheram o recurso que o Boavista apresentara no sentido de procurar anular a deliberação tomada pela CD da LPFP.
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