Ivan Ramos, 27 anos, nasceu e viveu toda a sua infância a cinco metros de um campo de futebol de 11 em Penedo de Janela, concelho do Paul, ilha de Santo Antão, mas em 2009 viu a infraestrutura, situada numa ribeira, ser destruída para dar lugar a uma estrada.
E desde então, ele e todos os amantes do desporto na localidade “migraram” para o futsal, chamada de “futebolinho” no país, e que passou a ser a modalidade mais praticada em Janela e a paixão de todos só foi aumentando com o tempo.
E ao estudar e depois trabalhar na cidade da Praia, o jovem santantonense sempre continuou a jogar futsal e no ano passado lançou o desafio para a oficialização da mobilidade, tendo para isso mobilizado dinamizadores e contado com núcleos em todo o país.
“A ideia surgiu da paixão que nutrimos por esse desporto, tentamos juntar os dinamizadores do futsal em todo o território nacional e por que não fazer um projeto unificado e estruturante para que o futsal possa alcançar um patamar muito mais levado”, descreveu o jovem atleta, que também joga futebol de 11, mas é no futsal onde sente como peixe na água.
“Costumamos dizer que futsal é um modo de viver, é um modo de estar, para nós é um estado de alegria e também é uma modalidade que nos permite maior liberdade. É onde sentimos mais à-vontade”, sustentou, em entrevista à agência Lusa, antes de mais um treino com os amigos, no Gimnodesportivo Vavá Duarte, na cidade da Praia.
Em julho de 2021, lançou o movimento “Juntos pela Oficialização do Futsal em Cabo Verde” e dois meses depois uma petição para ter competições oficiais (regionais e nacionais), criação da seleção cabo-verdiana de futsal e dinamizar o futsal feminino e veterano.
Desde o pontapé de saída, o grupo já manteve encontros com as principais instituições ligadas ao desporto em Cabo Verde, desde o Ministério do Desporto, o Instituto do Desporto e da Juventude (IDJ), a Federação Cabo-verdiana de Futebol (FCF) e algumas associações regionais de futebol.
Durante este ano, Ivan Ramos avançou que o movimento promete continuar a lançar a sementes, a nível regional e nacional, para estruturar o projeto e começar a ter competições oficiais em 2023.
“O primeiro passo será estruturar e oficializar as competições regionais, depois passar para competições nacionais e almejar, num futuro próximo, ter a seleção nacional de Cabo Verde”, traçou o principal dinamizador da oficialização do “futebolinho”, que almeja ter uma seleção nacional, embora reconheça que são aspetos da alcançada da federação de futebol.
Para todo este projeto e movimentações seguintes, Ivan Ramos disse à Lusa que uma das inspirações está a ser Pany Varela e Bebe, dois descendentes de cabo-verdianos que recentemente se sagraram campeões do mundo e da Europa por Portugal.
“O Pany Varela e o Bebe são dois descendentes de cabo-verdianos que muito nos orgulha e nós, amantes do futsal, tentamos agora ainda mais espelhar neles, e porque estas ilhas poderão ter muito mais Pannys e Bebes. A qualidade demonstrada nas competições faz-nos acreditar que é possível termos jogadores a jogar ao mais alto nível”, reforçou.
Além disso, lembrou que o futsal não é só na quadra, mas sim uma modalidade que arrasta multidões para os ‘polivalentes’ em todos os concelhos do país, permite intercâmbio de pessoas e de instituições e movimenta a economia local.
Após ultrapassar esta fase e estruturar, o dinamizador do grupo prevê mais formações aos jogadores, árbitros, treinadores e mesmo dos dirigentes. “O que já fazemos com uma boa qualidade no amadorismo, é estruturarmos essa qualidade para ser mais profissional”.
Segundo Ivan Ramos, o apelo agora é para que as instituições e organismos do país aderem à iniciativa, como o Instituto Cabo-verdiano para a Igualdade e Equidade de Género (ICIEG), o programa de atividade física Mexi-Mexê, do Ministério do Desporto, ou a campanha “Menos Álcool, Mais Vida”, da Presidência da República.
“Queremos aproveitar o futsal para ajudar nessas causas sociais, a luta contra o uso abusivo do álcool e das drogas e a questão de género. Aproveitar e jogar a modalidade que tanto amamos para fazer outras coisas que a nossa sociedade merece”, terminou.
Para a iniciativa, Ivan Ramos não trabalha sozinho e na cidade da Praia tem como representante do núcleo Jorge Mendes, mais conhecido por Zé Preta, 42 anos, que além de jogar, dedica também à arbitragem nesta modalidade.
E com a oficialização, não tem dúvidas que muita coisa vai mudar. “Os árbitros vão ter que primar para uma arbitragem com qualidade”.
Apesar de já ter participado em algumas formações, Zé Preta é de opinião que a arbitragem ainda é exercida de forma empírica no país, mas com a oficialização espera que os cursos sejam dados com maior frequência, para unificar o trabalho desses juízes no arquipélago.
Entre outras vantagens, apontou a evolução da modalidade. “Temos muito a ganhar com a oficialização do futsal. Temos obra-prima de sobra para a prática desta modalidade”.
Com os passos que estão a ser dados, Zé Preta não tem dúvidas que vai haver uma “explosão” do futsal em Cabo Verde, atraindo muitos árbitros que apitam no futebol de 11, mas que querem apitar nos ‘polivalentes’ e, quem sabe, representar o país em competições internacionais.
Em dezembro de 2021, aquando de mais uma eleição como presidente da FCF, Mário Semedo prometeu criar pelouros de futsal e de futebol de praia para a implementação dessas modalidades o mais urgente possível.
Este mês, o IDJ, em parceria com o Instituto Nacional de Estatísticas, financiada pelo Banco Mundial, terminou a recolha de dados para o primeiro Recenseamento Geral do Desporto em Cabo Verde, que tem como um dos objetivos recolher dados sobre o número e perfil dos praticantes, organizações, instituições e infraestruturas desportivas do país.
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