Dérbi, parte 1: o Benfica
Muito já se escreveu sobre o virar do ano do Benfica: o adeus prematuro a três competições, numa delas com a pior prestação de sempre de uma equipa portuguesa, dos pontos de atraso para os adversários diretos, do futebol pouco criativo praticado pelos homens de Rui Vitória, dos erros de casting que foram Gabigol e Douglas. Rui Vitória tinha dito que o dérbi desta quarta-feira não era decisivo, mas era inegável que a pressão para este encontro era mais do que muita. Basta voltar a ler o início deste texto para perceber porquê.
Assim como basta ver que aquele 'murro na mesa', depois de ter sido questionado sobre o envolvimento do Benfica em mais uma polémica, na antevisão ao encontro na Luz, tocou no coração do clube (palavras de Rui Vitória), mas também tocou, e muito, no coração do seu treinador. E Rui Vitória, que naquele momento pareceu querer deixar o papel de bom da fita, levantou a voz e arriscou. Arriscou contra um Sporting teoricamente mais forte e com mais saúde anímica.
O resultado chegou tardiamente, com uma grande penalidade convertida por Jonas a desfazer a vantagem conseguida por Gelson Martins - noite de estreia a marcar em dérbis para ambos - mas antes, muito antes, já havia posse, agressividade, e um sem número de oportunidades desperdiçadas por parte dos 'encarnados'. Tantas que qualquer crítica à arbitragem de Hugo Miguel acaba por cair em saco roto. Krovinovic percebeu isso e fez questão de o dizer no final do jogo: "Não vou falar sobre arbitragem porque o nosso trabalho é jogar. Tivemos muitas boas oportunidades: bolas na trave, bolas sobre a linha… mas a bola não quis entrar."
Assim foi. Depois de 15 minutos a ver ao longe a baliza de Rui Patrício - o mesmo aconteceu com o Sporting - os 'encarnados' foram traídos pela eficácia do rival: Gelson, num desvio de cabeça, a aproveitar alguma passividade da defesa benfiquista, fazia o 1-0. E a partir daí, o Benfica aumentou o ritmo e foi com tudo para a área adversária: Jardel a cabecear contra Piccini junto à linha de golo, Jonas a atirar contra a cara de Coentrão, Krovinovic contra a trave... Os 'encarnados' encostavam os seus médios à área, a fim de pressionar a equipa 'leonina', que estava irreconhecível, mas, verdade seja dita, em vantagem.
Perante esse cenário, Rui Vitória sabia que tinha de arriscar ainda mais e assim foi: primeiro, trocou Pizzi por Jiménez (passando do 4x3x3 para o 4x4x2), depois Fejsa por Rafa e, finalmente, Rúben Dias por João Carvalho. André Almeida começou como lateral direito, passou por médio defensivo, e terminou a central. Certo é que o risco compensou: depois de uma série de remates falhados, dois deles quase a traírem Rui Patrício, o Benfica chegou ao empate já na reta final. Mão na bola Acuña, penálti convertido por Jonas, e uma equipa (aparentemente) disposta a virar a página com o virar do ano. Apesar de estar a cinco pontos do FC Porto.
Dérbi, parte 2: o Sporting
Jorge Jesus chegava ao Estádio da Luz com a confiança de quem sabia que a sua equipa era mais do que capaz de bater o Benfica. O Sporting continuava na luta em todas as frentes - tinha descido para a Liga Europa, depois da companhia de Barcelona e Juventus na fase de grupos da Champions - ainda não tinha somado qualquer derrota nas competições internas e respirava saúde. Daí que o dérbi do desempate, que acabou por dar empate, tenha acabado por inverter as expectativas do treinador 'leonino'.
A equipa de Alvalade está agora a dois pontos do FC Porto, líder isolado e sem dúvida o grande vencedor deste encontro, mas a verdade é que fez pouco para sair do campo do rival com os três pontos. Na altura em que os dois adversários entravam em campo, os 'dragões' estavam empatados em Santa Maria da Feira, e talvez isso explique o porquê de tanta disputa no centro do terreno, com o meio-campo do Sporting a anular o do Benfica e vice-versa.
Acabou por ser Gelson Martins a desatar o nó tático, com um remate de cabeça directo para o fundo da baliza de Bruno Varela, após cruzamento/remate de um muito assobiado Fábio Coentrão. O Sporting estava como queria: a vencer no terreno do eterno rival, e se assim continuasse até ao apito final, seriam já seis os pontos a separar as duas equipas. A tranquilidade, contudo, deu lugar ao sufoco, com o Benfica a encostar os jogadores 'leoninos' junto à própria área, tornando difícil a saída com bola.
A equipa de Jorge Jesus resolvia defensivamente, mesmo com a crescente pressão dos rivais, e quando rematava, ainda que pouco, fazia-o de fora da área: primeiro Acuña, com a bola a ressaltar em Rúben Dias, e, já perto do intervalo, Gelson Martins surgiu em excelente posição, após passe de Bruno Fernandes, mas o remate saiu por cima da baliza. Por outro lado, havia um Bruno Varela atento às investidas do adversário - bem ao impedir o que podia ser o 'bis' do extremo português.
Já Rui Patrício nunca chegou a ser colocado à prova, a não ser no penálti, mas não ganhou para o susto em inúmeros lances, quando Coates ou Piccini desviavam para a trajetória contrária do guardião 'leonino'. Os homens de Jorge Jesus ainda tentavam despachar a bola para Bas Dost, mas sem sucesso. O Sporting tinha desaparecido ofensivamente no segundo tempo. Restava, então, fechar os espaços e segurar a vantagem até quando fosse possível. Neste caso, até Battaglia cortar com a mão um remate de Rafa, já perto do minuto 90. Hugo Miguel nem precisou de recorrer ao videoárbitro desta vez, e Jonas, de grande penalidade, riscou mais um 'grande' da sua 'bucket list' - são já 19 os golos do brasileiro, que lidera isolado o 'ranking' dos melhores marcadores do campeonato.
O Sporting acabou por não perder o dérbi, mas perdeu muito do dérbi ao não arriscar mais. Esperava-se mais de Jorge Jesus, o homem da tática, que projetou todas as possibilidades de vitória para a formação de Alvalade, mas falhou ao não mexer as peças do jogo em conformidade com essa ambição (também por mérito do adversário). Contas feitas, que é o que interessa nestas lides do futebol, os 'leões' mantêm os três pontos de vantagem sobre o Benfica e continuam invictos no campeonato, agora mais atrasados em relação ao FC Porto.
Comentários