A defesa de Sérgio Conceição pediu hoje ao tribunal que o antigo diplomata Francisco Seixas da Costa seja condenado com uma indemnização civil por alegada difamação agravada ao treinador do campeão nacional de futebol FC Porto.
Nas alegações finais do julgamento, cuja leitura do acórdão ficou agendada para 26 de setembro, às 14:30, no tribunal criminal do Bolhão, no Porto, a procuradora reconheceu subsistir uma conciliação “exigente” entre “a liberdade de expressão e o direito à honra”.
“Ao Ministério Público (MP) se afigura dever ser garantida neste caso uma tutela mínima essencial do direito à honra. Sabemos que os juízos de valor provocam entre nós uma questão complexa, atendendo à sua subjetividade, especialmente quando se reportam à apreciação de uma pessoa, e não de um comportamento, com uma expressão suscetível de lesá-la. Certamente, o tribunal irá encontrar ou proferir uma decisão justa”, declarou.
Ressalvando que “não há qualquer hierarquia nem subordinação” entre “direitos de igual valor”, a procuradora frisou que foram apurados factos que permitiram provar a utilização da expressão “javardo” pelo ex-diplomata e contextualizar as “consequências sentidas”.
Francisco Seixas da Costa recorreu a esse vocábulo para classificar Sérgio Conceição na rede social Twitter, em 31 de março de 2019, dia seguinte à vitória dos ‘dragões’ na visita ao Sporting de Braga (3-2), em jogo da 27.ª jornada da edição 2018/19 da I Liga.
“Sérgio Conceição até parece não ser um mau treinador! Mas é - sejamos claros! - um javardo. Não vale a pena estar com eufemismos. Aqueles adeptos do FC Porto que se reveem no seu estilo são isso mesmo - uns javardos. Como o são os adeptos do (meu) Sporting que gostam do Bruno de Carvalho [à data presidente dos ‘leões’]”, escreveu.
Na ausência de Sérgio Conceição e do respetivo advogado, Pedro Henriques, a defesa do treinador ‘azul e branco’ manifestou-se hoje convicta de que o diplomata se colocou “voluntária e conscientemente à margem” da esfera inerente à liberdade de expressão.
“Há a intenção de diminuir aquela pessoa, colocando-a como um homem das cavernas, um ser humano sujo, primitivo e um animal, que é aquilo que é um javardo. Um animal em toda a sua dimensão, exceto como treinador, porque não é mau. Esta consideração não pode ser aceitável e é um discurso perigoso, que nos devolve a uma lógica tribal, medieval e feudal, na qual os bons estão de um lado e os maus do outro”, argumentou.
A defesa do técnico recordou ter visto um “ataque ad hominem em contexto que não o justificava” e espera que prevaleça “o direito à honra e ao bom nome”, dizendo que “a própria liberdade de expressão traça os seus limites e tem de considerar dois esteios”.
“O futebol não é uma questão de interesse geral e um treinador não é mais do que um assalariado do clube. Diferentemente dos fenómenos desportivos estão as pessoas que ocupam centros de poder, como os presidentes dos grandes clubes, cuja irrestrição no comentário político é bastante mais significativa. Ao contrário de [Jorge Nuno] Pinto da Costa, Sérgio Conceição não é um homem político, mas uma figura mediática”, notou.
Esse raciocínio foi contrariado por Manuel Magalhães e Silva, advogado de Francisco Seixas da Costa, ao assumir que “o mundo do futebol” extravasa “largamente” a cúpula institucional diretiva do FC Porto e é “tema de continuado debate e interesse público”, pois “cria paixões e formas de opinião muito mais alargadas face ao ambiente político”.
“Não duvido de que o ‘tweet’ lança achas na fogueira do universo das redes sociais e das massas associativas dos clubes. Agora, os direitos à revolta e à indignação estão constitucionalmente protegidos como formas de intervenção. Não há limites se houver uma base factual mínima no juízo de valor, por mais ofensivos que sejam os termos”, disse, avaliando “javardo” como a “opinião generalizada de grosseiro ou mal-educado”.
Em 11 de março, antes do início do julgamento no tribunal criminal do Bolhão, a própria juíza do processo fomentou uma tentativa de acordo entre as partes, que saiu gorada.
Sérgio Conceição e o seu advogado, Pedro Henriques, desejavam que a declaração de Francisco Seixas da Costa incluísse um “pedido de desculpas”, mas o ex-secretário de Estado dos Assuntos Europeus queria que assentasse apenas na admissão de que se excedeu e lamentava a mágoa causada ao treinador do FC Porto pelo termo “javardo”.
Face à indignação gerada por essa publicação nas hostes do emblema ‘azul e branco’, Francisco Seixas da Costa recorreu horas depois ao seu blogue “Duas ou Três Coisas” para admitir “com serenidade” que tinha exagerado na utilização de “palavras duras”.
Um dia mais tarde, a SAD do FC Porto repudiou “veementemente” as declarações do diplomata e constituiu-se assistente no processo movido por Sérgio Conceição, sendo que o início do julgamento foi, depois, adiado de janeiro de 2021 para março de 2022.
Comentários