Os dois troféus de campeão europeu de futebol conquistados pelo FC Porto elevaram a presidência de Pinto da Costa, falecido no passado sábado aos 87 anos, num percurso ‘manchado’ pelas suspeições de corrupção no processo judicial Apito Dourado.

Entre 23 de abril de 1982 e 07 de maio de 2024, o sucessor de Américo de Sá tornou-se o mais antigo e titulado dirigente da modalidade, ao acumular 69 êxitos, incluindo sete internacionais, durante 42 anos e 15 mandatos, até ser destronado por André Villas-Boas.

Bases do FC Porto europeu lançadas com José Maria Pedroto

A promessa de colocar os ‘dragões’ numa final europeia demorou apenas dois anos a ser efetivada, com a equipa então orientada por António Morais, face à doença prolongada de José Maria Pedroto, a perder a Taça dos Vencedores das Taças frente aos italianos da Juventus (1-2), em 1983/84, lançando as bases da emancipação europeia ‘azul e branca’.

O FC Porto desafiaria a lógica em 27 de maio de 1987, no Estádio Prater, em Viena, na Áustria, ao dar a volta aos alemães do Bayern Munique (2-1), com golos de Rabah Madjer, num calcanhar para a lenda, e Juary, rumo à conquista da Taça dos Campeões Europeus.

Treinador dos primeiros títulos de campeão nacional da era Pinto da Costa (1984/85 e 1985/86), Artur Jorge findava em glória a primeira passagem pelo clube e deu lugar ao jugoslavo Tomislav Ivić, que selaria o primeiro ‘triplete’ internacional da história do futebol.

Depois da Taça dos Campeões, os ‘azuis e brancos’ agregaram ao seu palmarés troféus exclusivos do futebol luso: a Taça Intercontinental frente aos uruguaios do Penãrol (2-1, após prolongamento), debaixo de um nevão em Tóquio, no Japão, em 13 de dezembro de 1987, e a Supertaça Europeia, com duas vitórias por 1-0 sobre os neerlandeses do Ajax.

O FC Porto travou os momentos de glória internacional na década de 1990, marcada pelo inédito ‘penta’, de 1994/95 a 1998/99, mas recuperaria os tronos europeu e mundial na viragem do milénio, quando Pinto da Costa contratou José Mourinho à União de Leiria.

Despedido pelo Benfica e rejeitado no Sporting, o treinador setubalense começou por lograr a única Taça UEFA do futebol nacional, graças ao êxito perante os escoceses do Celtic (3-2 no final dos 120 minutos), em 21 de maio de 2003, em Sevilha, Espanha.

Um ano mais tarde, em 26 de maio, quando já tinha transitado das Antas para o recém-inaugurado Estádio do Dragão, o FC Porto subiu a fasquia e arrebatou a Liga dos Campeões, ao bater os franceses do Mónaco (3-0) em Gelsenkirchen, na Alemanha.

O clube ‘azul e branco’ tornou-se o último vencedor da principal competição europeia de clubes fora dos cinco principais campeonatos (Inglaterra, Itália, Espanha, Alemanha e França), logrando um feito que apenas o Ajax tinha consumado, em 1994/95, desde a substituição da Taça dos Campeões Europeus pela Liga dos Campeões, em 1992/93.

Com José Mourinho de saída para os ingleses do Chelsea e uma aposta efémera no italiano Luigi del Neri em pleno defeso, o espanhol Víctor Fernández orientou a derrota frente aos compatriotas do Valência (1-2) na Supertaça Europeia, prova na qual os ‘dragões’ já tinham vacilado no ano anterior frente aos italianos do AC Milan (0-1).

Seguiu-se novo triunfo na Taça Intercontinental em Tóquio, no desempate por penáltis com os colombianos do Once Caldas (8-7, após empate 0-0 no final do prolongamento), em 12 de dezembro, numa altura em que Pinto da Costa já era visado fora dos relvados.

Apito Dourado: uma mancha na presidência de Pinto da Costa

Desencadeado em abril de 2004, o processo Apito Dourado investigou alegados casos de corrupção no futebol português, tráfico de influências e coação sobre árbitros, levantando suspeitas sobre o presidente do FC Porto nos jogos com o Estrela da Amadora (2-0), e o Beira-Mar (0-0), para as 19.ª e 31.ª jornadas da edição 2003/04 da I Liga, respetivamente.

Em 02 de dezembro, a Polícia Judiciária (PJ) rumou com mandados de busca e detenção à residência de Pinto da Costa, que não estava no local, mas apresentou-se no dia seguinte em tribunal e viria a sair em liberdade, mediante uma caução de 200 mil euros.

Apesar de não constar da acusação do Ministério Público (PJ), foi novamente visado em dezembro de 2006, quando a ex-companheira Carolina Salgado, de quem se tinha separado no início daquele ano, revelou histórias controversas vividas entre ambos no livro "Eu, Carolina", que bateu recordes de vendas e deu origem ao filme “Corrupção”.

O processo foi reaberto meses depois, mas o Tribunal Constitucional fez cair a maioria das acusações, ao considerar ilegal a utilização de escutas telefónicas, que tinham sido difundidas na Internet e eram a principal prova contra Pinto da Costa e outros arguidos.

O Apito Dourado despoletou na justiça desportiva o processo Apito Final, que, em maio de 2008, viu a Comissão Disciplinar (CD) da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP) suspender o dirigente por dois anos e subtrair seis pontos ao FC Porto, que tinha sido tricampeão nacional em 2007/08, com 75 pontos, 20 sobre o Sporting, segundo colocado.

Essas decisões seriam anuladas pelo Conselho de Justiça (CJ) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) em julho de 2017, quatro meses antes de Pinto da Costa ser também absolvido na Operação Fénix das suspeitas de contratação ilegal de segurança privada.

Nessa altura, o FC Porto já tinha abastecido o seu museu com a última conquista além-fronteiras, ao lograr a Liga Europa numa final 100% portuguesa com o Sporting de Braga (1-0), em 18 de maio de 2011, em Dublin, na República da Irlanda, sob alçada de André Villas-Boas.

O mais jovem técnico de sempre a vencer uma prova de clubes da UEFA festejou quatro troféus em cinco possíveis em 2010/11, a única época em que orientou o atual recordista de títulos no futebol luso, ao qual voltaria 13 anos depois para derrotar com estrondo Pinto da Costa nas eleições mais participadas da história ‘azul e branca’ e iniciar uma nova era presidencial.