O secretário de Estado da Juventude e do Desporto, João Paulo Correia, admitiu hoje existir um cenário de “abuso de confiança e usurpação de poderes” na Federação Portuguesa de Judo, da parte do ex-presidente.
Em audição requerida pelos grupos parlamentares do PSD e do PS, João Paulo Correia deixou claro que as denúncias efetuadas e as declarações prestadas na terça-feira podem configurar essa situação e dar lugar a um novo inquérito ao antigo dirigente.
“Aquilo que ouvimos ontem [terça-feira] foi um conjunto de denúncias que podem configurar usurpação de poderes e abuso de confiança por parte do ex-presidente da Federação de judo, com a conivência da atual direção da FPJ. E ouvimos também denúncias acerca da ausência de um departamento técnico no seio da federação, revelando que o ex-presidente exercia funções para além das funções da presidência, exercia funções técnicas. Inevitavelmente, darão lugar a um novo inquérito, que terá de ser célere e conclusivo”, sublinhou o SEDJ.
João Paulo Correia lembrou que o papel fiscalizador pertence ao Instituto Português da Juventude e do Desporto (IPDJ), que o tem feito, e que da parte do Governo existe o garante de que o IPDJ tem as condições necessárias para exercer essa função.
“A entidade que fiscaliza é o IPDJ, o Governo tem de assegurar que o IPDJ tem condições para essa atividade fiscalizadora, mas, no caso concreto, após a carta aberta [as denúncias de um grupo de sete judocas em agosto do último ano], entendi que devia exercer uma função de diplomacia, com a federação e atletas”, lembrou.
Na audição, o governante procurou não só historiar o processo, desde a tentativa de diálogo, aos inquéritos e auditoria à Federação Portuguesa de Judo, que ainda decorre, por parte do IPDJ, como vincar a ‘limitação’ da secretaria de Estado, não avançando, em prol da preparação olímpica, com uma retirada de estatuto de utilidade pública à FPJ.
“A faculdade de retirar a utilidade pública será sempre de última instância, que impedirá o estado de financiar a modalidade […]. O nosso principal objetivo foi garantir o apoio à modalidade a um ano e três meses dos jogos de Paris2024. Apesar desta crise, grave, desde a primeira hora procurámos garantir o financiamento, para que os atletas, estes que exerceram o direito de denuncia, para que não ficasse em causa a preparação para Jogos Olímpicos e Paralímpicos”, justificou.
No que diz respeito ao financiamento para Paris2024, João Paulo Correia destacou que a judoca Telma Monteiro foi a primeira a reconhecer que não existe um problema de dinheiro ou financiamento, mas de gestão da federação, e a que a preparação não está em causa.
“O financiamento teve um aumento histórico […]. A bolsa de todos os atletas não era aumentada desde 2009, e é aumentada em 20% para atletas e treinadores”, assinalou ainda João Paulo Correia, explicando não existirem problemas nesta matéria.
Para o governante, a crise no judo, que “desprestigia a modalidade”, passa também pela falta de bom senso, extensível aos órgãos em funções da Federação Portuguesa de Judo, a quem teceu duras críticas de conivência com Jorge Fernandes, o ex-presidente, destituído em dezembro.
“O que faltou sempre foi bom senso, isto não acontecia se a Assembleia Geral tivesse recusado a lista de Jorge Fernandes [a uma recandidatura, que o tribunal desconvocou]”, disse o secretário de Estado.
João Paulo Correia respondeu aos deputados com a perplexidade de ver a mesma Assembleia Geral da FPJ destituir um presidente e, no minuto seguinte, mandatá-lo para exercer uma gestão corrente até novo eleitoral.
“Se houver bom senso por parte dos órgãos sociais, o assunto fica resolvido no minuto seguinte. Porque é manifestamente público que o ex-presidente Jorge Fernandes está, com o seu comportamento e atitudes, e com algumas conivências, a implodir o prestígio de uma modalidade e que a ajudou a afirmar o desporto nacional na cena internacional”, concluiu.
A audição de hoje, no senado da Assembleia da República, requerida por PSD e PS, seguiu-se a uma longa audição na terça-feira, aos judocas, requerida pelo BE, mas também ao ex-presidente da FPJ, Jorge Fernandes, ao presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP), José Manuel Constantino, e ao presidente do IPDJ, Vítor Pataco.
As audições requeridas por vários grupos parlamentares seguiram-se à crise que ‘estalou’ em agosto de 2022, com um grupo de judocas, entre os quais Telma Monteiro, a denunciarem um clima de opressão e um ambiente tóxico, dirigindo fortes críticas ao ex-presidente.
Mais tarde, num inquérito aberto pelo IPDJ, após queixa da Associação de Judo de Castelo Branco, Jorge Fernandes perdeu o mandato por incompatibilidades ao abrigo do artigo 51 do Regime Jurídico das Federações Desportivas, sendo destituído em dezembro.
O dirigente recandidatou-se ao cargo, juntamente com os órgãos sociais – após ofício do IPDJ a indicar que deveria proceder-se a uma eleição global -, mas o Tribunal de Loures, após providência cautelar da Associação de Castelo Branco, desconvocou essas mesmas eleições, determinando que as mesmas deveriam realizar-se apenas para o cargo de presidente, estando agora marcadas para 29 de abril.
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