Valentina da Fonseca não deverá querer ouvir falar mais de futebol nos próximos tempos. Esta portuguesa radicada na Alemanha comprou quatro bilhetes por mais de 1400 euros na plataforma online Viagogo, juntamente com o marido e as duas filhas, para ver o Portugal-Turquia, da fase de grupos do Euro 2024, mas ficou às portas do estádio do Borussia Dortmund.
Irritada, zangada, desgastada com toda a situação, garante que jamais usará a plataforma para fazer qualquer tipo de compras, apesar da Viagogo garantir o reembolso dos bilhetes.
As filhas, garante Valentina, ficaram às portas do Signal Iduna Park a chorar, depois de terem feito mais de quatro horas de viagem, de Hamburgo para Dortmund, na esperança de ver o jogo ao vivo.
A portuguesa, casada com um alemão de ascendência turca, sente-se burlada pela empresa. Em conversa com o SAPO Desporto, conta que viveu uma das piores experiências da sua vida.
Um sonho desfeito às portas do Signal Iduna Park
Tudo começou a 02 de dezembro de 2023, quando foi conhecido o calendário do Euro 2024, que decorre na Alemanha até ao dia 15 deste mês. Valentina da Fonseca, radicada na Alemanha há 10 anos, e o marido, Bahadir Ozcetin, alemão de ascendência turca, encontraram o jogo perfeito para levar as duas filhas, de cinco e oito anos.
"Dissemos às nossas meninas que íamos lá ver o Cristiano Ronaldo, e elas estavam entusiasmadas", começou por contar.
Assim, a 11 de dezembro de 2023, Valentina e Bahadir pagaram 1440,72 euros por quatro bilhetes de categoria 2 (categoria intermédia), bilhetes esses que custam ou custavam 150 euros, cada um, no site da UEFA. Ou seja, pagaram mais de 1440 euros por bilhetes que custavam 600 euros.
Com o aproximar da data do Portugal-Turquia, da 2.ª jornada do Grupo F, Valentina quis saber mais sobre os bilhetes, que nunca mais chegavam, até porque o cunhado (o marido da irmã), que comprou ingressos para esse jogo na mesma plataforma, já os tinha recebido na sua caixa de correio eletrónico. Foi-lhe garantido que iria recebe-los quando chegasse a Dortmund. Puro engano.
"O pior da história é que nos enganaram do início ao fim, de uma maneira muito... Eles diziam-nos, 'Não se preocupem, os senhores vão ter os vossos bilhetes'. E diziam que já tinham falado com este e com aquele, que estava tudo tratado. Foram horas e horas a falar com eles, a telefonar para os EUA. Com a hora do jogo a aproximar, íamos ligando cada vez mais para tentar saber, mas a resposta deles era: 'Vão ter os vossos bilhetes, não se preocupem'", detalha a portuguesa ao SAPO Desporto.
"No último dia disseram-nos, 'às 03h da tarde a UEFA vai disponibilizar os bilhetes e vamos entregá-los, caso isso não suceda, teremos bilhetes alternativos para vocês. E se não houver bilhetes alternativos, serão reembolsados'. E é aí que começa a história, o meu marido disse-lhes, 'em momento algum falámos em reembolsos', completa.
Pela primeira vez, a Viagogo conseguia cumprir com o prometido... mas apenas pela metade.
"Às 03h da tarde do dia do jogo [22 de junho] vieram dois bilhetes, e nós dissemos-lhe logo, 'nós comprámos quatro'. E eles continuavam com a história dos 'alternative tickets', que só tínhamos de clicar nos links que iam enviar-nos'. Mas ao clicar no link que nos enviaram, íamos para outro lado, e quando voltámos a ligar, eles disseram-nos, 'ah, mas vocês pediram um reembolso dos bilhetes'. E eu respondi, 'mas você acha que sou estúpida? Estou aqui no estádio, acha que vou pedir um reembolso de bilhetes quando estou à porta para entrar?' E eles responderam que no sistema estavam a ver que tínhamos pedido um reembolso. Já não sabíamos se era mentira deles, se, por não terem bilhetes, o link nos mandava diretamente para o reembolso", conta.
Desgastada com toda a má experiência que estava a ter, Valentina recorreu às redes sociais para denunciar a situação. A Viagogo prontamente quis ajudar, ao que Valentina explicou-lhes que já estava há mais de cinco horas ao telefone com várias pessoas da empresa, a tentar resolver o problema.
Dois bilhetes para quatro pessoas: "Não nos peçam para escolher"
Poucas horas antes do Portugal-Turquia, a esperança de Valentina e família verem o jogo no estádio do Dortmund ainda estava viva. Ansiosos, colados ao telefone, iam trocando e-mails, ligando para a Viagogo, que ia garantindo que estariam no jogo.
Foi assim que receberam... dois bilhetes, dos quatro que pagaram. Escolher quem iria ver o jogo estava fora de questão.
"Com dois bilhetes, seria muito feio um de nós entrar com uma das crianças e deixar a outra cá fora, não havia solução, não se podia escolher, seria demasiado duro. Elas têm oito e cinco anos, são pequeninas, se fossem mais velhas... Imagina, acompanhar as claques até ao estádio, as bandeiras, com tudo, ver toda a gente a entrar, e nós ali à espera. Foi muito triste para elas", confessa, Valentina.
O sonho das filhas era ver Cristiano Ronaldo ao vivo. E até já tinham contado aos primos e às colegas na escolha que estariam no estádio para ver o craque português.
Para Valentina, a má experiência foi atenuada com a vitória de Portugal. O marido, a torcer pela Turquia, acabou por se resignar. Seria pior se visse a derrota dentro do Signal Iduna Park.
"O meu sonho era ver o jogo, se Portugal tivesse perdido, eu teria ficado mais... o meu marido não ficou assim tão afetado, ficou zangado no início, mas ao ver os golos de Portugal, ele disse, 'olha, se calhar não é assim tão mau [não ter entrado no estádio]'. E cá fora nem conseguimos ver o jogo nos ecrãs gigantes porque estes estavam num espaço fechado, com pessoas a fumar... não é um ambiente para crianças. O futebol tem que ser inclusivo, mas com toda a gente a fumar... não vimos nada do jogo", lamenta.
Depois de quatro horas de viagem, de Hamburgo até Dortmund, de ter que pagar quartos de hotel, muito caros por esta altura na Alemanha, Valentina confessa que teria sido muito melhor se a Viagogo os tivesse preparado para a possibilidade de não conseguirem bilhetes.
"Sentimos que eles estavam a gozar conosco", declara.
Após toda a situação, Valentina garante: "Para mim, Viagogo nunca mais. Fiz uma publicação no Twitter a alertar as pessoas... independentemente do reembolso, fica a experiência. Viagogo, nem pensar, nunca mais".
Enquanto aguardava cá fora, desolada, desiludida e cansada, depois de ter feito uma viagem tão longa, de ficar a poucos metros de entrar, de ver as filhas chorarem, Valentina não deixava de pensar na injustiça de toda a situação: "Entendo que há coisas piores na vida, mas naquele momento, senti-me estafada. O tempo investido, ver pessoas a vender bilhetes lá fora a mil euros. Pagámos 1400 euros para quatro bilhetes".
Esta portuguesa radicada na Alemanha até pensou em apresentar queixa contra a empresa, mas diz-se sem forças para enfrentar tudo o que viria a seguir.
"É tanta coisa, são as crianças, o trabalho, uma pessoa não tem tempo para nada.... Vontade para apresentar queixa não me faltou, mas falta-me energia, de andar atrás. Eles vão fazer o reembolso, mas o que não percebo é que o reembolso devia vir com juros, não é correto...", finaliza.
Entre as dezenas de e-mails trocados entre o marido de Valentina, Bahadir Ozcetin, e a Viagogo, a empresa acabou por admitir que enviou os bilhetes errados para o casal. Pouco menos de uma hora antes do jogo começar, a Viagogo enviou um mail a avisar Bahadir Ozcetin que tinha sido reembolsado como pediu, algo que o mesmo garante nunca ter feito.
O casal admite que alguns dos links enviados pela empresa para confirmar a compra dos bilhetes às portas do estádio eram, afinal, para confirmarem que tinham optado pelo reembolso, algo que nunca solicitaram.
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