A família de Ansumane Fati, jogador guineense do Freamunde, reza todos os dias para que ele tenha sucesso: o dinheiro que ganha em Portugal serve para comprar a comida que todos têm à mesa na Guiné-Bissau.
«Precisamos de muito apoio dele e é por isso que pedimos a deus para o ajudar na carreira», explica Mussá Seide, 32 anos, um dos irmãos do jogador.
Na família, salvo um ou outro biscate, ninguém tem um trabalho estável e Ansumane «é o único» que pode os ajudar financeiramente, refere Mussá.
Se um dia ele deixasse de receber, «toda a família ia chorar», refere.
Na casa onde Ansumane viveu, ninguém faz a coisa por menos: esperam que ele consiga ter tanto sucesso como Bruma, jogador luso-guineense do Sporting vendido no final de agosto ao Galatasaray, da Turquia, e que vai ganhar um milhão de euros por ano.
Ser pelo menos tão bom como Bruma, «é o que todos na família esperam», diz Mussá, crente de que este é um pedido razoável, pois nem «sequer» lhe pedem que seja como «o Cristiano Ronaldo ou o Messi».
No anexo onde o atleta do Freamunde morava ainda estão guardadas as faixas de outros clubes por onde passou e que os familiares agora exibem com orgulho, ao mesmo tempo que mostram inúmeras fotografias do jogador.
Mussá já perdeu a conta do número de familiares que beneficiam do dinheiro que Ansumane ganha em Portugal.
«Somos muitos», refere, num português articulado a custo, enquanto aponta para todos quantos o rodeiam à volta do poço, no quintal comum a várias habitações do Bairro Militar de Bissau - onde se vive com menos que o essencial, por entre a terra batida e telhados de chaparia.
Só naquela tarde estão por ali cerca de 30 familiares de todas as idades, homens e mulheres, aos quais o ponta-de-lança não deixa faltar os tradicionais sacos de cinco quilos de arroz - na Guiné-Bissau, um prato cheio não vale de nada se não tiver arroz.
Mãe, irmãos, sobrinhos e outros membros da família dependem de Ansumane, que já não veem há quatro anos.
«Tenho muitas saudades do Ansu», diz a mãe, Sona Fati, 48 anos, ao falar do filho como alguém que desde muito novo batalhou para ganhar dinheiro, conseguindo vingar no futebol e assim conquistar a oportunidade de rumar a Portugal.
«Ele joga direito e marca golos», diz a mãe, em crioulo, ao garantir que deu à luz um bom avançado para qualquer plantel.
Ao lado, Mamadu Seide, de 12 anos, sobrinho de Ansumane, não esconde o desejo de um dia seguir as pisadas do tio: o rapaz gosta de futebol e quer ir para Lisboa, porque «o futebol tem dinheiro».
Adilé Sebastião, de 27 anos, lançou em 2012 uma academia de futebol em Bissau com 25 jovens e hoje diz já ter sete pupilos prontos para rumar a Portugal.
Conheceu Ansumane em solo luso, antes de o jogador rumar ao Freamunde, e aponta-o como um caso ilustrativo daquilo com que muitas famílias sonham num dos países mais pobres do mundo.
«Todos os dias recebo uns dez telefonemas de pais que dizem que os filhos são talentos do futebol», refere.
«Para nós, pobres, em África ou algures na América Latina, o futebol acaba por ser uma tábua de salvação para os miúdos e para as famílias», sublinha Adilé.
É por isso que, a cada jornada, em casa de Ansumane, em Bissau, a família vive o resultado da equipa com tanto ou mais fervor como qualquer adepto ferrenho do Freamunde.
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