O julgamento do processo Football Leaks, que tem Rui Pinto como principal arguido, vai conhecer hoje a leitura do acórdão, mais de dois anos e meio após o início no Juízo Central Criminal de Lisboa.
A divulgação da decisão, agendada para as 10:00, sobre o caso do criador da plataforma eletrónica que em 2015 agitou o futebol mundial pode, todavia, não significar que se saiba já hoje o desfecho de um dos processos mais mediáticos dos últimos anos.
A pairar sobre o julgamento está a greve dos funcionários judiciais – que já adiou várias diligências -, mas também uma possível alteração não substancial dos factos e da qualificação jurídica pelo coletivo de juízes presidido por Margarida Alves, o que pode exigir tempo às defesas para se pronunciarem, como já se verificou noutros processos de maior complexidade e que não será de descartar num caso com contornos inéditos na justiça portuguesa.
Visto por uns como pirata informático e por outros como denunciante, Rui Pinto chega a esta fase com outra consciência do caso que começou a ser julgado no dia 04 de setembro de 2020, após ter sido detido na Hungria no início de 2019, tendo assumido o seu arrependimento e a prática de alguns crimes na sua última intervenção perante o tribunal.
“O Ministério Público e os advogados estão equivocados se consideram que não há um arrependimento sincero da minha parte. Não vou dizer que tenho a vida destruída, porque ainda estou vivo e enquanto há vida, há esperança... Mas tive comportamentos errados que violam a lei, claramente”, disse o criador do Football Leaks no encerramento das alegações finais, em janeiro, sem deixar de enaltecer as revelações do Luanda Leaks, que foram igualmente abordadas ao longo do julgamento.
Durante este período, Rui Pinto estreitou também a colaboração com a Polícia Judiciária (PJ), permitindo assim o acesso aos discos informáticos apreendidos aquando da sua detenção. Por outro lado, sabe-se que o jovem portuense é já arguido noutro processo por factos relacionados com os que estão em causa no atual julgamento, conforme revelou em tribunal o advogado do arguido, Francisco Teixeira da Mota, em 10 de outubro de 2022.
“Rui Pinto foi constituído de novo arguido relativamente a factos que estão aqui em julgamento. O processo tem três anos, mas o Ministério Público só nesta sexta-feira constituiu Rui Pinto como arguido”, afirmou o mandatário, que deixou críticas ao que disse ser uma “estratégia perversa” do Ministério Público (MP).
O outro arguido deste caso, o advogado Aníbal Pinto, que responde apenas pelo crime de tentativa de extorsão à Doyen, reafirmou na conclusão das alegações finais a sua conduta ao longo de todo o processo, repetindo a lisura da sua atuação: “Ao longo de mais de 60 anos de vida nunca cometi qualquer crime. Em prol da minha defesa, gostava que ficasse claro que em nenhum momento o meu comportamento foi criminalmente reprovável”.
O MP pediu a condenação de Rui Pinto a pena de prisão, ao notar que ficaram provados os acessos ilegítimos aos servidores da Federação Portuguesa de Futebol, da Procuradoria-Geral da República e da sociedade de advogados PLMJ (todos assistentes no processo), admitindo somente que não se provou a sabotagem informática à SAD do Sporting, como constava da acusação.
Recusando o enquadramento de Rui Pinto no estatuto de denunciante, a procuradora Marta Viegas acrescentou ainda que se provou a tentativa de extorsão a Nélio Lucas, antigo CEO do fundo de investimento Doyen, crime pelo qual defendeu que o advogado Aníbal Pinto deve também ser condenado pelo tribunal.
Rui Pinto, de 34 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto de 2020, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.
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