Alan Varela, Nico González e, ontem, Vasco Sousa. Onde eles estiveram, esteve a bola. É quase sempre no meio-campo que o jogo deste novo FC Porto se vai moldando, empoleirando-se sobretudo na primeira fase de construção desenhada por Alan Varela e criteriosamente pintada pelo maior artista dos azuis brancos, Nico González.
A Nico não lhe falta nico algum para se impor nesta nova realidade, guarnecido de uma fineza rara que parece sobressair pela autonomia que lhe é concedida. É por ele que surge o primeiro golo dos dragões, fruto da paciência do médio emprestado pelo Barcelona, que soube resistir à pressão, capaz de decidir o momento certo para lançar outro espanhol, de seu nome Iván. Na época passada andou pelas ruas da amargura, mas encontrou-se. Ou encontraram-no, deixo ao seu critério. Talvez a junção das duas respostas seja a mais fiel.
Balanceado pelo lançamento in extremis oferecido por Nico, Jaime nunca parou de correr até disparar - qual atirador turco - sem hipóteses para Gabriel Baptista. Nem sempre dá golo, obviamente, mas esta equipa sabe que pelo meio é forçosamente mais forte, sempre de olhos postos nos avançados, agora mais falsos, e nos extremos, também eles a procurarem tantas vezes o miolo. E hoje, sem Eustáquio, mas com um trabalhador irrequieto, sempre a pedir a bola e a recuperá-la com uma velocidade e força desconcertantes: Vasco Sousa.
Lá perto, Danny Namaso já é uma das peças basilares de Vítor Bruno. O inglês, que não é bem um avançado, vinha não raras vezes da esquerda direto ao centro ajudar na construção, contribuindo para a enorme dinâmica ofensiva, desconcertante para quem a tenta travar, muitas vezes sem referências fixas no atraque. Nem mesmo Navarro o foi, sempre muito móvel à entrada da área.
Sem Taremi e já sem poder contar com Evanilson, melhor marcador do FC Porto na última época, Vítor Bruno vê em Jaime e Navarro a possibilidade de ferir sem que o adversário cerque os seus soldados mais avançados. Namaso, uma das imagens de marca do novo dragão, também usou e abusou de algumas estiradas, quase sempre pelo meio, onde a virtude mais gosta de morar.
Tudo pareciam favas contadas, mas não foram, de todo. Antes, logo aos cinco minutos de jogo, Diogo Costa sacudiu o azar com uma agilidade e velocidade estonteantes. Safira tinha tudo para marcar, nessa luta sempre desiquilibrada entre o David e o Golias, de quem tem 7,32 metros para defender e de quem dispõe de 7,32 metros para marcar. Mas ali, naquele instante, como em tantos outros em que está o guardião do FC Porto, a baliza mingou. O avançado do Santa Clara fez tudo bem, mas Diogo Costa fez melhor ainda. Soberba a intervenção do internacional português, amarrado ao Dragão por uma cláusula de 75 milhões de euros. Será suficiente para blindar este poço de talento?
Defesa monumental de Diogo Costa
O susto não impediu o primeiro golo dos azuis e brancos, nem impedia o segundo. Desta vez foi Navarro, espanhol que não sabia o que era ser titular desde outubro do ano passado, a sofrer uma falta evidente em zona proibida de Alysson - algo ingénuo na forma como abordou o lance. Galeno já salivava, estava ainda Fábio Veríssimo a aguardar a validação do VAR, e não tremeu no momento de dilatar a vantagem. O extremo, agora volta e meia lateral, como aconteceu hoje e no jogo anterior, soma já quatros golos em três jogos e é dos que sobrevivem no onze portista apesar do assédio oriundo de Itália, mais precisamente de Turim. O mesmo não se pode dizer, por exemplo, de Pepê. Titularíssimo de Sérgio Conceição que só jogou vindo do banco com Vítor Bruno. Seguirá o caminho de Evanilson? Mas foquemo-nos em Galeno.
Se alguém pensou que a cabeça do jogador brasileiro pudesse estar noutro lado, não está. Ou se está, disfarça mesmo muito bem. Farta-se de correr, solidário com os colegas tanto a defender como a atacar, um (surpreendente?) exemplo de atitude competitiva numa fase de enorme instabilidade para qualquer jogador, cientes de que o mercado ainda está aberto.
Apesar do 2-0, o Santa Clara voltaria a assustar ainda na primeira parte, e não foi pouco. Depois da majestosa defesa logo a abrir a partida, Diogo Costa errou. Sim, deverá estar escandalizado, mas garanto-lhe que aconteceu mesmo. Diogo Costa é humano. Provavelmente não vai acreditar, é compreensível, mas é mesmo humano. Uma abordagem falhada deixou a baliza aberta e nesse momento - ainda agora elogiámos Galeno, não foi?- o brasileiro cortou a bola mesmo em cima da linha de golo. Tão em cima que Veríssimo ainda esperou que lhe dissessem algo desde a Cidade do Futebol, o que não aconteceu. A bola não passou a fronteira da alegria para quem remata, da tristeza para quem sofre.
Na segunda parte, um Santa Clara mais pressionante foi deixando a dúvida no ar sobre o desfecho da jogo, dúvida essa que se dissiparia aos 67 minutos com a expulsão de Adriano Firmino, cujo cérebro colapsou no exato momento em que decidiu colocar os seus pitons a beijar o peito do pé de Alan Varela. O beijo não foi consentido, naturalmente, e Veríssimo encaminhou o brasileiro para os balneários, para desespero de Vasco Matos, técnico dos açorianos, impotente perante tamanha adversidade.
O momento
São dois, na verdade. Primeiro, evidentemente, a defesa colossal de Diogo Costa logo aos cinco minutos, numa altura em que o jogo estava 0-0. Uma intervenção do outro mundo que permitiu ao FC Porto não entrar no jogo a perder, o que poderia dificultar e muito a estratégia de Vítor Bruno para esta partida. E depois, claro, a infantilidade incompreensível de Adriano Firmino, que numa abordagem grosseira, calcou por completo o pé de Alan Varela, acabando expulso por sugestão do VAR. Não se pode dizer que o lance em si teve influência no resultado final , o jogo já estava 0-2, mas a falta que cometeu expô-lo em demasia, a ele e à sua equipa, que a partir daquele momento viu a montanha que tinha para escalar agigantar-se ainda mais perante os seus olhos.
O melhor
Galeno e Iván Jaime. Ambos marcaram, o brasileiro desde os onze metros, mas é de louvar a atitude de Galeno numa fase decisiva e muito incerta quanto ao seu futuro. O avançado aparentemente cobiçado pela Juventus não para de faturar este ano, razão só por si muito válida, mas que acentuada com a enorme disponibilidade e solidariedade demonstradas para com os colegas ao longo de toda a partida, tem feito do extremo uma espécie de operário-mor da tal gerigonça azul e branca. Uma nota justa para Safira, avançado do Santa Clara que tanto trabalho foi dando à dupla Otávio e Zé Pedro.
O pior
Adriano Firmino, sem margem para dúvidas. A falta cometida sobre Alan Varela pode bem ser usada num manual de um qualquer futuro curso de arbitragem, para retratar o que é uma abordagem absolutamente grosseira a um lance, desinteressado da bola e demasiado interessado no pé do jogador, cuja integridade física acabaria por ser colocada em causa.
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