O piloto neerlandês Max Verstappen (Red Bull) entrou para a galeria dos maiores heróis da Fórmula 1 ao confirmar em Las Vegas a conquista do quarto título mundial consecutivo, numa temporada em que começou 'Max', passou a 'Medium' até mostrar o seu lado 'Mad'.

Ao contrário de 2023, em que dominou a época de uma ponta a outra, ao vencer 19 das 22 provas disputadas para terminar com 575 pontos (92,7% de aproveitamento), mais que o dobro do vice-campeão Sergio Perez (seu colega de equipa teve somente 285 pontos), em 2024 Max teve de suar para vencer.

Verstappen começou a temporada a ameaçar exercer um domínio semelhante ao ano passado, ao vencer sete das primeiras 10 corridas da temporada (Bahrain, Arábia Saudita, Japão, China, Emilia Romagna, Canadá e Espanha).

Seguiram-se, porém, 10 corridas sem qualquer vitória, em que apenas foi ao pódio quatro vezes (três segundos lugares, na Grã-Bretanha, Países Baixos e Singapura, e um terceiro, nos Estados Unidos). Nesse entretanto, a McLaren mostrou uma grande subida de forma, ultrapassando mesmo a Red Bull na liderança do Mundial de Construtores.

Mas quando a Red Bull foi ultrapassada pela McLaren e mesmo pela Ferrari a nível de performance, veio ao de cima a capacidade de 'Mad Max', nome que faz referência à personagem do ator Mel Gibson no filme homónimo. Hoje o neerlandês é um piloto mais maduro, que raramente comete erros, capaz de tirar o máximo do carro, mesmo quando este não está a responder.

Nas provas em que a Ferrari e a McLaren, e mesmo a Mercedes pareciam estar à frente dos Red Bulls, Verstappen conseguiu minimizar as perdas, conquistando pontos cruciais numa luta até ao fim com Lando Norris (McLaren), o único que lhe fez frente. Nas corridas onde não tinha o melhor carro, terminou em 6.º no Mónaco, Itália e México, 5.º na Áustria, Hungria e Azerbaijão, 4.º na Bélgica e 3.º nos EUA, minimizando desta forma os estragos. Em Las Vegas, a 5.ª posição foi suficiente para assegurar o título, um lugar à frente do seu grande rival desta temporada, Lando Norris (McLaren) que foi sexto.

Eu entro no circuito e mudo a chave de modo calmo para agressivo

Esta época, Max Verstappen venceu apenas oito das 22 provas já disputadas, embora tenha brilhado nas corridas Sprint, com vitórias em cinco dos seis mini-GP's de sábado.

Com o título de hoje, Max Verstappen ultrapassou Ayrton Senna, Nelson Piquet, Niki Lauda, Jackie Stewart e Jack Brabham para se juntar a Sebastian Vettel e Alain Prost, os outros pilotos com quatro títulos de campeão da Fórmula 1.

Verstappen fica assim a um título de igualar os cinco de Juan Manuel Fragio e a três do alemão Michael Schumacher e do britânico Lewis Hamilton, os mais titulados de sempre, ambos com sete.

"A melhor coisa que aconteceu à Fórmula 1 nos últimos anos"

Conhecido pelo seu caráter intempestivo dentro de pista, Verstappen foi já apontado pelo antigo patrão da Fórmula 1, o britânico Bernie Ecclestone, como "a melhor coisa que aconteceu à modalidade nos últimos anos".

O neerlandês já tinha sido o mais novo de sempre a competir na categoria rainha do desporto automóvel, antes mesmo de ter idade para ter a carta de condução.

 Max Verstappen
Max Verstappen Max Verstappen c créditos: GONZALO FUENTES / POOL / AFP

Filho de um antigo piloto, Jos Verstappen, 'Mad' Max tornou-se em 2022 num dos campeões mais precoces da Fórmula 1, ao assegurar o título a cinco corridas do final.

Em 2023 fez ainda melhor e sagrou-se campeão no GP do Qatar, a cinco Grandes Prémios do final. Nesse brilhante 2023, bateu vários recordes, entre eles o de maior pontuação da história numa única temporada, ao conquistar 575 pontos, 92% dos 620 disponíveis para um piloto em todas as 22 corridas do ano, mais os pontos extra de volta mais rápida e os oito de cada uma das seis corridas sprint da temporada.

Neste momento, é o terceiro maior vencedor de todos os tempos, com 62 triunfos, ainda longe dos 91 de Michael Schumacher, e do seu atual rival Lewis Hamilton, líder do ranking com 105 vitórias.

Ainda no fantástico ano de 2023 que dificilmente será repetido, conseguiu bater o recorde de maior número de vitórias em um ano (19 em 22 possíveis), bateu o recorde de vitórias consecutivas (10), maior número de vitórias na temporada partindo da pole (12), Maior número de voltas lideradas em um ano (liderou 1003 das 1325 voltas), maior número de pódios num ano (21 das 22 corridas).

'Mad' Max: um campeão moldado pelo pai no paddock

Desde cedo que o jovem Max, filho mais velho de Jos e Sophie Kumpen, entrou no mundo da competição, desde logo porque o pai tinha sido o mais bem-sucedido piloto dos Países Baixos até então.

Ser piloto de Fórmula 1 era "um sonho de criança", admitiu, no início da carreira.

Mas também a mãe competiu, com sucesso, em karts, modalidade em que o agora campeão se iniciou aos quatro anos de idade.

Aos 15, viria mesmo a sagrar-se campeão mundial em karting, demonstrando que a educação rígida que recebeu em casa estava a formar um piloto de elite.

A relação dura com o pai é um dos segredos mais mal-escondidos do 'paddock', e o próprio Max recordou, em 2019, à margem do Grande Prémio da Rússia de Fórmula 1, um episódio em que o pai o abandonou numa bomba de gasolina, em Itália, depois de se ter despistado numa corrida "que deveria ter vencido facilmente", sendo que os dois estiveram a semana seguinte sem se falar.

Max Verstappen com o pai e ex-piloto de F1 Jos Verstappen
Max Verstappen com o pai e ex-piloto de F1 Jos Verstappen O piloto holandês Max Verstappen, com 16 anos, fala com o pai e ex-piloto de F1 Jos Verstappen, antes do Zandvoort Masters de Formula 3 em Zandvoort na Holanda, em 2014. créditos: FOTO AFP / ANP / SANDER KONING

É precisamente devido a essa pressão familiar que Max Verstappen não encontrou "surpresas na Fórmula 1", pois não houve "ninguém mais duro" consigo do que o próprio pai.

Gerindo a carreira do filho com mão de ferro, Jos Verstappen guiou o jovem Max à Fórmula 1 através da Toro Rosso, a equipa satélite da Red Bull, em 2015, iniciando um trajeto em que quebrou vários recordes de precocidade da modalidade.

Talhado para bater recordes

Com 17 anos e 166 dias, tornou-se, no Grande Prémio da Austrália desse ano, no mais novo de sempre a participar a tempo inteiro no 'Grande Circo'.

Duas corridas mais tarde, na Malásia, foi o mais novo de sempre a pontuar, com 17 anos e 180 dias, ao ser sétimo classificado.

Em 2016, já com a temporada em curso, o ultra confiante e, por vezes, polémico piloto, que se define como neerlandês apesar de ter nascido na Bélgica, em Hasselt, foi promovido à equipa principal da Red Bull, substituindo o russo Daniil Kvyat. E, logo na corrida de estreia pela equipa, venceu o GP de Espanha, com 18 anos e 228 dias.

O sucesso de Max Verstappen na Fórmula 1 foi sendo construído à base de vários incidentes, muitos deles provocados pela impetuosidade em pista -- acompanhado de uma honestidade 'crua' fora dela -, fenómeno que Max foi controlando com o passar do tempo.

A imagem que o Max tem é diferente de quem ele é como pessoa.

Depois de dois terceiros lugares no campeonato, em 2019 e 2020, Verstappen, que cumpriu 27 anos em 30 de setembro, conquistou o quarto título da sua carreira depois da vitória polémica de 2021, na última prova da temporada, em Abu Dhabi, frente a Lewis Hamilton, e das temporadas dominadoras de 2022 e 2023, em que bateu vários recordes.

O neerlandês, que em 2021 se tornou no 34.º campeão diferente e no quarto mais novo, atrás do alemão Sebastian Vettel, do próprio Lewis Hamilton e do espanhol Fernando Alonso, persegue, agora, outros recordes da modalidade.

Dono de uma personalidade vincada e pouco expansiva fora da pista, transfigura-se dentro do carro, tendo protagonizado ao longo da carreira diversos incidentes com outros pilotos.

"Eu entro no circuito e mudo a chave de modo calmo para agressivo", admitiu, em 2016, numa entrevista ao jornal brasileiro GloboEsporte.

Já em 2021, antes do Grande Prémio de Portugal, o mexicano Sérgio Pérez, seu companheiro de equipa na Red Bull, confessou-se "surpreendido" com a personalidade do neerlandês.

"A imagem que o Max tem é diferente de quem ele é como pessoa. Claro que ele quer ser muito rápido, é muito competitivo, mas tudo que se vê na comunicação social, eu ainda não vi. Para ser sincero, estou bastante impressionado nesse aspeto", confessou o mexicano.

Mas a Fórmula 1 está presente na vida do piloto de 27 anos também fora das pistas, pois desde o início de janeiro de 2020 que confirmou o namoro com a modelo brasileira Kelly Piquet, filha do antigo piloto e campeão mundial de Fórmula 1 brasileiro Nélson Piquet.

Avesso aos holofotes da fama, recusou participar no documentário 'Drive to Survive' da plataforma Netflix, por não gostar da forma como era retratado nas primeiras temporadas e ficar nervoso com a presença constante das câmaras durante os fins de semana de Grande Prémio.

"Normalmente, não sou alguém que gosta de ter câmaras por perto", admite.

Contudo, no final de 2020 viria a lançar o seu próprio documentário, 'Whatever It Takes', com a sua visão do campeonato.

Aos 27 anos, Max Verstappen já está na galeria dos maiores nomes de sempre da Fórmula 1.

*Com Lusa