"Tenho 20 anos e nunca tive o período. Tenho 20 anos e tenho osteoporose. Tenho 20 anos e transformei-me nesta rapariga, que treinou em excesso, que ficou sem energias, a rapariga de quem todos falavam, mas que todos pensam que isto nunca se irá passar com eles", é assim que começa o relato de Bobby Clay, uma jovem atleta e fenómeno do atletismo britânico, que há dias teve coragem para contar tudo o que tem sofrido. A história é contada pelo jornal espanhol ´Marca`.

Aos 15 anos, Bobby Clay entrou na equipa de sub-20 da Grã-Bretanha que iria competir nos mundiais de crosse em Bydgoszcz, Polónia. E tinha tudo para ser uma estrela.

"Superava com facilidade o que me pediam nos treinos. Queria mais, queria competir, ao menos, nos sub-20. O meu treinador foi cauteloso e pediu-me para ir com calma, para não me exceder, mas não lhe dei ouvidos. Pensei que precisava da mesma carga de trabalho do grupo de 20 anos", começa por contar Bobby.

Nesse período, Bobby destacava-se nas pistas. Foi quando começou a ter os primeiros sintomas de RED-S, Relative Energy Deficency in Sport, em inglês, ou Deficiência Energética Relativa no Desporto.

"Juro que nunca tive qualquer transtorno alimentar, mas a comida passou a ser um inimigo entre as minhas amigas no grupo de atletismo. Mas a mim faltava-me o ´combustível` e estava a submeter o meu corpo a treinos excessivos. Como todas as atletas, era obsessiva. Mas o perigo era que conseguia cumprir os meus objetivos nos treinos, apesar de tudo, pelo que fazia mais do que mera pedido", contou.

O que é o RED-S?

O RED-S é uma síndrome produzido pelo desequilíbrio entre o que se come e o gasto energético. Afeta muitos aspetos da função fisiológica do corpo, como a taxa metabólica, a função menstrual, a saúde óssea, a imunidade, a síntese de proteínas, a saúde cardiovascular e psicológica. Acreditava-se que afetava apenas as mulheres, mas nos últimos anos também se tem revelado em alguns homens.

Bobby Clay
Bobby Clay Bobby Clay

De acordo com Iñaki Arratibel, médico e professor na Universidad del País Vasco, citado pela ´Marca`, o RED-S devia ser "integrado no grupo de transtornos alimentares porque se parece mais com anorexia nervosa restritiva, muitas vezes provocada por uma excessiva preocupação com o peso".

Uma das consequências desta síndrome em Bobby foi amenorreia (ausência de menstruação). Com 16 anos, a menstruação de Bobby Clay nunca tinha baixado. Foi quando os pais decidiram leva-la a um médico para se perceber o que se passava. Disseram-lhe que se tratava de um "desenvolvimento tardio", logo não havia nada a fazer.

"Para mim era uma vantagem para o meu rendimento, ainda por cima, ajudava-me a ter um baixo índice de massa corporal", contou Bobby.

Com 17 anos o processo repetiu-se, sempre com o mesmo diagnóstico. Mas no verão em que atingiu a maioridade, tudo se complicou. Bobby teve uma fratura num pé quando praticava natação numa piscina. O resultado da densidade óssea revelou que sofria de osteoporose, consequência da sua alimentação.

Em algumas situações, incluindo a nível ósseo, o corpo feminino precisa desta função (ciclo menstrual) para a sua regulação e, no caso de Bobby, o seu corpo precisava desse ciclo.

"Tinha traçado o meu destino. Nunca me senti tão sozinha em toda a minha vida. As pessoas diziam que tudo haveria de voltar ao normal, mas não queria ouvir ninguém. Dei conta que tudo era culpa minha. Não desejo este sentimento a ninguém, nem ao meu pior inimigo", contou Bobby.

Há cinco meses que Clay recebe tratamento hormonal. "Esperamos dar ao meu corpo estas hormonas essenciais e, ao forçar o ciclo menstrual, estas hormonas comecem a ajudar a aumentar a densidade óssea", esclarece Bobby.

Ao contar a sua história, Bobby espera poder alertar e consciencializar os jovens atletas para que não cometem os mesmos erros.